À Luz do Estatuto da Criança e do Adolescente
1 INTRODUÇÃO
Desde o período colonial o Brasil registra histórias de violências perpetradas contra as crianças, que não eram consideradas sujeitos de direitos. Isso decorre do abuso do poder parental, mas também
[…] pelo descaso e tolerância da sociedade com a extrema miséria e com as mais diversas formas de violência a que são submetidas milhões de crianças, pela impunidade dos vitimizadores de crianças, por cortes orçamentários em políticas públicas e programas sociais. (GUERRA, 1985, p. 88).
O abuso sexual é uma das formas mais cruéis de maus-tratos infantis, porque, além de afetar fisicamente a criança, destrói todo o sentimento de pureza e dignidade que ela possui, é analisado como espécie de maltrato físico ou emocional. Esta violência pode ser definida como todo ato ou jogo sexual entre um familiar (seja ele responsável legal ou não da vitima) e uma criança/adolescente. Pode ou não haver contato físico e uso de força física.
O estupro é analisado historicamente como um comportamento decorrente da adaptação, utilizado por machos com habilidades precárias de competição na atração da fêmea com a qual pretendem copular. Em sua gênese, decorre do papel dominador do homem na cultura humana e da necessidade que o fraco tem de se destacar socialmente de alguma forma.
A Organização Mundial de Saúde define os maus-tratos sexuais como:
[…] as atividades de caráter sexual exercida por uma pessoa mais velha, contra a criança, com fins de prazer sexual. São classificados como abusos sensoriais (pornografia, exibicionismo, linguagem sexualizada); estimulação sexual (carícias inapropriadas em partes consideradas íntimas, masturbação) e ato sexual propriamente dito (realização ou tentativa de violação ou penetração oral, anal ou genital). (FONSECA; LAU; FARINATTI, 1996, p. 41-43).
Os aspectos que demonstram a ocorrência deste ato, são: a existência de um pai alcoólatra ou violento que foi abusado por sua família de origem fisicamente; pai autoritário ou extremamente puritano e de uma mãe passiva, ausente; padrasto na família; o fato de os pais terem sido abusados ou negligenciados em sua infância.
2 A CRIANÇA ABUSADA
Devido ao fato da criança não ser preparada psicologicamente para o estímulo sexual, e mesmo que não possa saber da conotação ética e moral da atividade sexual, quase invariavelmente acaba desenvolvendo problemas emocionais depois da violência sexual.
A criança, mesmo conhecendo e apreciando a pessoa que o abusa, se sente profundamente conflitante entre a lealdade para com essa pessoa e a percepção de que essas atividades sexuais estão sendo terrivelmente más. Ela também pode experimentar profunda sensação de solidão e abandono. Mudanças bruscas no comportamento, apetite ou no sono pode ser um indício de que alguma coisa está acontecendo, principalmente quando estar só ou quando o abusador estiver perto.
A vítima deste ato prolongado, usualmente desenvolve uma perda violenta da auto-estima, tem a sensação de que ter valor e adquire uma representação anormal da sexualidade. Ela pode tornar-se muito retraída, perder a confiança nos adultos e pode até chegar a considerar o suicídio, principalmente quando existe a possibilidade da pessoa que abusa ameaçar de violência se a criança negar-se aos seus desejos. Algumas destas crianças podem ter dificuldades para estabelecer relações harmônicas com outras pessoas, podem se transformar em adultos pedófilos, podem se inclinar para a prostituição.
Quando os abusos sexuais ocorrem na família, a criança pode ter muito medo da ira do abusador, medo das possibilidades de vingança ou da vergonha dos membros familiares ou, ainda, temer que a família se desintegre ao descobrir o ato.
Como salienta a Rosário:
[…] Comumente as crianças abusadas estão aterrorizadas, confusas e muito temerosas de contar sobre o incidente. Com freqüência elas permanecem silenciosas por não desejarem prejudicar o abusador ou por receio de serem consideradas culpadas. Crianças maiores podem sentir-se envergonhadas com o incidente, principalmente se o abusador é alguém da família. (ROSÁRIO, 1998, p. 14).
3 SEQÜELAS
Felizmente, os danos físicos permanentes como conseqüência do abuso sexual são muito raros. A recuperação emocional dependerá, em grande parte, da resposta familiar ao incidente. As reações das crianças ao abuso sexual diferem com a idade e com a personalidade de cada uma, bem como com a natureza da agressão sofrida. Um fato curioso é que, algumas (raras) vezes, as crianças não são tão perturbadas por situações que parecem muito sérias para seus pais.
O período de readaptação depois do abuso pode ser difícil para os pais e para a criança. Muitos jovens abusados continuam atemorizados e perturbados por várias semanas, podendo ter dificuldades para comer e dormir, sentindo ansiedade e evitando voltar à escola.
Segundo Azevedo (1997, p. 196) “as principais seqüelas do ato sexual são de ordem psíquica, sendo um relevante fator na história da vida emocional de homens e mulheres com problemas conjugais, psicossociais e transtornos psiquiátricos”.
Antecedentes de abuso sexual na infância estão fortemente relacionados a comportamento sexual inapropriado para idade e nível de desenvolvimento, quando comparado com a média das crianças e adolescentes da mesma faixa etária e do mesmo meio sócio-cultural sem história de abuso.
Em nível de traços no desenvolvimento da personalidade, o abuso sexual infantil pode estar relacionado a futuros sentimentos de traição, desconfiança, hostilidade e dificuldades nos relacionamentos, sensação de vergonha, culpa e autodesvalorização, à baixa auto-estima à distorção da imagem corporal, Transtorno Borderline de Personalidade e Transtorno de Conduta.
Em relação a quadros psiquiátricos francos, o abuso sexual infantil se relaciona com o Transtorno do Estresse Pós-traumático, com a depressão, disfunções sexuais (aversão a sexo), quadros dissociativos ou conversivos (histéricos), dificuldade de aprendizagem, transtornos do sono (insônia, medo de dormir), da alimentação, como por exemplo, obesidade, anorexia e bulimia, ansiedade e fobias.
4 ASPECTOS JURÍDICOS DO ABUSO SEXUAL
Os dispositivos legais, seja no âmbito civil, penal ou de legislação específica acerca dos direitos da criança e do adolescente, protegem o indivíduo, contra a prática de abuso sexuais, dada a sua incontestável gama de seqüelas.
A Constituição Federal de 1988, refere em seu artigo 227 que:
[…] é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar o menor de idade, com absoluta prioridade, todos os direitos fundamentais para uma boa vivência , além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão “, e no parágrafo quarto, cita que” à punição legal de qualquer espécie de abuso, violência e exploração sexual contra criança e o adolescente.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, como diploma legal especificamente destinado a defender os interesses destes, dispõe no artigo 5º que:
[…] nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
No E.C.A., também dispondo, em seus artigos 240 e 241, que é crime:
[…] o ato de produzir ou dirigir representação teatral, televisiva ou película cinematográfica, utilizando-se de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica, assim como de fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança e adolescente.
O Código Penal, possui nos artigos 217, 218 e 224 dispositivos que tratam dos delitos de natureza sexual, os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, quando praticados contra menos de quatorze anos de idade, gozam da presunção de violência. De outro lado, esta abuso de caráter intrafamiliar constitui causa de aumento de pena.
Quanto à prostituição infantil, não há dispositivo penal. Por outro lado, o favorecimento à prostituição, qualquer que seja a idade da vítima, ou a manutenção de casas de prostituição, são condutas coibidas como práticas criminosas. O tráfico de mulheres também é vedado, porém, não há dispositivo penal que trate especificamente do tráfico de crianças para fins de prostituição infantil.
5 CONCLUSÃO
O ato sexual em menores é um fato real em nossa sociedade e é mais comum do que muita gente pensa. Deixa marcas para toda a vida. Além das seqüelas físicas, existe a depressão, o medo, a culpa, a incapacidade de confiar determinadas pela violência psicológica a que são submetidas às crianças.
O que deve ser feito é escutar a vítima passividade, fazer a denuncia policial, buscar ajuda médica e levar a criança para um exame com o psiquiatra. O tratamento adequado pode reduzir o risco do adolescente desenvolver sérios problemas no futuro, mas a prevenção ainda continua sendo a melhor atitude.
Podemos melhorar esta situação, obrigando o Estado a cumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente, obedecendo-o, para que os menoridade tenham mais liberdade de viver sem medo e temores.
A verdade é que a agressão de natureza sexual tem conseqüências tão sérias no desenvolvimento da criança e do adolescente, bem como o atinge tão completamente (física, psíquica e emocionalmente). Por isso, devemos ter total cuidado com elas, e ficar atento com os adultos que as rodeiam, e principalmente nos pais, padrastos e vizinhos e os irmão mais velho são os agressores sexuais mais freqüentes e desafiadores.
Dessa forma, é certo afirmar que o abuso sexual não escolhe classe social e independe do nível cultural dos envolvidos, bem como que advém, na maioria das vezes, de uma situação ‘transgeracional’, ou seja, que passa de uma geração para a outra.
REFERÊNCIAS
BALLONE GJ – Abuso Sexual Infantil. In. PsiqWeb. Disponível em: . Acesso em 17 out. 2003.
BRASIL. Código penal. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto e Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt. 37. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
BRASIL. Constituição (2003). Constituição da República Federativa do Brasil. Coordenação de Giselle de Melo Brag Tapai. – 8º. ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente. Disponível em: