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domingo, dezembro 22, 2024

A MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL

A Mundialização do capital

“Os sinais presentes sugerem que os banqueiros do mundo tem propensão ao suicídio (…) já se deixou que as coisas fossem tão longe que se tornou extraordinariamente difícil encontrar uma saída”
John Maynard KEYNES – Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro -Inflação e Deflação

Esta citação de Keynes, escrita no início do século passado, relatava o espanto de como a riqueza dos ativos reais de uma economia transmutavam-se em capital no sistema financeiro, precisamos lembrar que quando Keynes fez sua obra, ele o fez tendo a experiência da crise de 1929 viva em sua mente, e também é espantoso a atualidade deste comentário.
Dizem que a geopolítica é a incorporação geográfica da política, do poder, como tão bem nos lembrou o sueco Rudolf Kjellén, em seu artigo “As grandes potências”, publicado em 1905, quando utilizou pela primeira vez o termo geopolítico, embora a compreensão política do território já fosse algo analisado desde Aristóteles, Sun Tzu, Maquiavel entre outros, sem esquecer os clássicos da geopolítica, como Ratzel, Mackinder, Mahan, Haushofer entre outros, que compreendiam a importância do território para determinar os meios de ação que os atores, no caso o Estado, possuem para que possam agir no ambiente, na verdade determinar os meios de ação que são possíveis, determinar a sua capacidade de poder.
É interessante abordar a questão da mundialização do capital e as crises econômicas mundiais fazendo um paralelo com a ótica geopolítica, pois esta representa uma percepção de ação do Poder, no caso pela via geográfica, para que os Estados possam concretizar seus projetos e sua interação externa, e mesmo o potencial de ação internacional, em suma, as ferramentas de ação que o Estado tem a sua disposição para que possa agir, o Estado possui consciência dos limitantes e vantagens do seu território, é um elemento previsível, e lógico, visível e real.
Já quando falamos de crises econômicas mundiais, entramos em um território enevoado que normalmente só torna-se claro quando a turbulência já passou, e então vemos inúmeros economistas criticando tal ou tal ação econômica de um determinado governo como culpado pela crise que foi instaurada, na verdade há um adágio que dita que os economistas são os profetas do passado… o que por si não é algo necessariamente ruim, o pior é a visão, iniciada na década de 50 e muito forte em início de 70 de tornar as ciências humanas exatas como um cálculo matemático, onde ao analisarmos dois fatores, teríamos como soma final um terceiro fator dado como certo, esta deturpação na economia também foi visto em outras ciências humanas, como a história, a geografia e até mesmo no campo das Relações Internacionais, onde esta ação behaviorista utilizou-se em demasia gráficos, planilhas, dados estatísticos, para dar uma ar de ciência exata, calculável, a algo que em princípio é impossível de auferir previsibilidade, que é a realidade, o objeto de estudo destas ciências.
Para entendermos o processo das crises econômicas mundiais precisamos entender a dinâmica do capital e sua evolução ao longo do tempo, a formação do capital financeiro através da junção do capital bancário mais o capital industrial, a mundialização do capital produtivo através dos Investimentos Diretos Estrangeiros, a mundialização do capital financeiro, na forma de Investimentos Indiretos, capitais especulativos etc, precisamos olhar também a questão da revolução na informática e nas telecomunicações, é preciso também entender os processos políticos e econômicos e suas respectivas forças centrípetas (de unificação) e centrífugas (fragmentação) e como estas afetam as economias das nações. É preciso enfim, analisar as crises tendo como pano de fundo cenários políticos e econômicos.
Uma das características das crises econômicas mundiais e da mundialização do capital é que a velocidade de propagação e a intensidade da movimentação dos fluxos financeiros tornaram virtualmente impossível o seu controle a partir da deflagração, a possibilidade de operar em diversos mercados ao redor do mundo faz com que os capitais operem alheios à vontade dos Estados Nacionais, e estes possuem pouca eficácia com seus instrumentos de política monetária e fiscal, na verdade acabam sendo dependentes do capital externo para viabilizarem suas políticas econômicas ou mesmo sua balança de pagamentos. Um dado interessante é que entre 1980 e 1990, o volume mundial de transações de ações através da fronteiras se elevou em 28% ao ano, de US$ 120 bilhões para US$ 1,4 trilhões anuais, o que mostra a força e a velocidade deste processo.
Uma sensação, talvez provocada pelo distanciamento histórico dos fatos, é a de que as crises econômicas mundiais sejam um aspecto novo, mas sempre houve na história do capitalismo os chamados “crashs”, sendo inerentes ao próprio sistema capitalista, como já proferira Schumpeter em sua tese “Destruição Criadora”, ou mesmo Karl Marx em seu “Manifesto Comunista”. O Brasil já enfrentou ao longo de sua história diversas crises econômicas, podemos enumerar o, a suspensão da conversibilidade dos mil-réis a partir da crise de 1929, as moratórias inevitáveis durante a depressão dos anos 30, as sucessivas negociações com os credores oficiais e com o FMI no final dos anos 50 e começo dos anos 60, a crise da dívida externa nos anos 80, as crises asiáticas, russas e a mais recente, ainda não transfigurada em crise, mas com o elemento catalisador da maioria das crises de financiamento do capital, que é a suspeita de solvência da economia de um país, no caso, dos papéis e títulos públicos do governo brasileiro e a capacidade de serem pagos estes juros, a suspeita faz com que a rolagem da dívida possa não ser feita, o que provocará medidas na política de câmbio ou de juros na economia.
Se olharmos, no entanto, o que ocorria há vinte e cinco anos atrás, podemos verificar o impressionante volume de instrumentos de política disponíveis para os governos interferirem em suas economias, através de impostos, gastos públicos, taxa de juros, controles de crédito, taxas de câmbio, controles de capitais e políticas de renda. Com as mudanças provocadas com a mundialização, os instrumentos de intervenção governamental perderam grande parte de sua força.
O mercado global de capitais funciona segundo as regras do mercado, nada mais é do que um mecanismo de formação de preço dos capitais e de alocação aos seus usos mais produtivos. Os mercados agem recolhendo e processando informação, funcionando como um espelho da realidade da situação econômica, a crise do México tinha como pano de fundos desequilíbrios econômicos e erros da política doméstica.
Já dizia Adam Smith, em seu livro “A riqueza das Nações”, – “… o bom pagador é dono da bolsa alheia” – os mercados seguem uma lógica similar, eles deslocam capital dos centros onde é abundante e migra para onde há as oportunidades, nos países subdesenvolvidos, emergentes, carentes de capitais para fortalecer/alimentar sua economia de crédito e poupança. O problema ocorre quando o mercado, como no momento atual, está avesso a qualquer suspeita de risco mais elevado, a crise brasileira, embora ainda não configurada como uma crise, já possui o estopim para tal, já que há um questionamento da solvência da economia brasileira, mais específco, a solvência da dívida pública interna, compostos de empresas multinacionais e as próprias pessoas físicas, que temem que o governo brasileiro torne-se insolvente.
O grande problema, já dito no início, é como parametrizar um dado que é no mínimo, subjetivo, que é a solvência, que não significa se um país pagou ou não tal título, mas a confiança que o mercado possui em uma economia, em um país, e classificá-la nos índices do Moody´s ou do Standard & Poors para os riscos dos países para os investidores, embora muitas vezes estas agências constatam erros ou distorções nas economias de diversos mercados, há certo exagero em algumas classificações, como colocar uma economia com a nossa abaixo da Nigéria, o que ocorria há alguns dias e pode voltar a acontecer, mesmo com uma economia complexa como a nossa.
Um dos grandes problemas em um cenário como este é como repensar a forma de conduzir a política econômica dos Estados, afinal, na medida em que os mercados financeiros cresçam e as ligações entre os mercados se aprofundem, esses mercados funcionarão como um único mercado na avaliação dos riscos (e nas decisões de investimento), se tal fato ocorrer, como é provável, o mercado de capitais terá um papel cada vez mais importante na determinação das taxas de câmbio e de juros, afetando substancialmente as políticas monetárias e fiscais domésticas, em um cenário como este, é cada vez mais difícil até mesmo para pensarmos em uma Política Externa Independente, que penso eu, foi descontinuada a partir de 82, com as renegociações da dívida externa, embora muitos digam que com a ditadura houve um alinhamento automático.
Há crises mais recentes no cenário internacional, como a recente crise argentina, mas como ainda não está claro quais serão as soluções para este problema resta esperar para verificarmos as ações da comunidade internacional e as reações da economia argentina, por sinal, um dos maiores exemplos de fragilidade dos Estados Nacionais e da capacidade de correção do mercado quando há distorções macroeconômicas dos países.
A mundialização do capital provocou maiores oportunidades de interação entre as nações, ao mesmo tempo também aprofundou as dependências das economias da periferia às potências, tornando mais difícil administrar as políticas monetárias e fiscais, embora sempre o foram, o que torna-se imperativo é uma discussão em torno do regulamento do sistema financeiro, por ora, a melhor medida para proteger-se de futuras crises é estabelecer políticas econômicas consistentes, de buscar uma maior compreensão da natureza do problema do que em uma cruzada contra a globalização ou os mecanismos da economia moderna

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