“Pago porque a lei me obriga, mas não concordo. A desatenção dele foi o que provocou o acidente. Porque sou eu o responsável?”
Este é um dos relatos que os empresários fazem ao se depararem com a condenação ao pagamento de indenização por dano moral ou material ao empregado acidentado.
Assim como o empregador acredita muitas vezes não ser o culpado pelo empregado sofrer um acidente, tampouco teria o próprio empregado, a intenção de provocar o acidente, sob pena de ficar inválido ou incapacitado, sem poder prover o sustento à sua família ou pelo risco de estar “descartando” sua vida pessoal ou profissional.
Acidente do trabalho é aquele que ocorre no exercício de atividade a serviço da empresa e provoca lesão corporal ou perturbação funcional, que pode causar a morte, a perda ou a redução permanente ou temporária da capacidade para o trabalho.
Consideram-se, também, como acidente do trabalho:
A doença profissional ou do trabalho, produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade;
Acidente típico, que é aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa;
Acidente de trajeto, que é aquele que ocorre no percurso do local de residência para o de trabalho ou desse para aquele, considerando a distância e o tempo de deslocamento compatíveis com o percurso do referido trajeto.
O prejuízo material decorrente do acidente de trabalho se caracteriza pela diminuição das possibilidades em obter os mesmos rendimentos por meio da força de trabalho de que dispunha o empregado antes do fato ocorrido. Anota-se que essa redução diz respeito à profissão ou ofício então desenvolvidos, não a qualquer atividade remunerada (art. 950, Código Civil de 2002).
DEVER DE INDENIZAR – DOLO OU CULPA?
O dever de indenizar surgiu da teoria do risco gerado, ou seja, se é o empregador quem cria o risco através de sua atividade econômica (empresa), a ele caberá responder pelos danos causados, independente de dolo ou culpa. A este contexto, atribuímos a teoria da responsabilidade objetiva.
Assim dispõe o art. 927 do Código Civil ao determinar que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano (empregador) implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Se me proponho a estabelecer uma empresa que pode oferecer riscos na execução das atividades, se me disponho a contratar pessoas para executar estas atividades e se os benefícios (lucros) gerados por estas atividades cabem somente à mim (empregador), logo, o risco do negócio, assim como os resultantes dos acidentes, também serão por mim suportados.
Por outro lado, há também o entendimento de que deveria se atribuir a teoria da responsabilidade subjetiva, ou seja, somente após comprovar que houve dolo ou culpa do empregador é que poderia responsabilizá-lo pelo acidente e conseqüentemente pela indenização ao dano causado.
Assim dispõe a Constituição Federal em seu artigo 7º, inciso XXVIII, que é direito dos trabalhadores o seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
O dolo é a intenção de agir contra a lei ou contrariamente às obrigações assumidas, agir de má-fé, é querer enganar mesmo com pleno conhecimento do caráter ilícito do próprio comportamento.
A culpa é a negligência, a falta de diligência (cuidado) necessária na observância de norma de conduta, isto é, não prever o que é previsível, porém sem intenção de agir ilicitamente e sem conhecimento do caráter ilícito da própria ação.
Como podemos observar, há uma norma constitucional direcionando para a responsabilidade subjetiva e uma norma infraconstitucional direcionando para a responsabilidade objetiva.
ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL – NEXO DE CAUSALIDADE
Assim como em diversos outros assuntos trabalhistas, a questão fica para ser solucionada pelo entendimento jurisprudencial, onde os juízes tomam as decisões diante dos fatos probatórios apresentados no processo.
Ora podemos entender que houve culpa do empregado no acidente de trabalho pela falta de cuidado ao manusear o equipamento ou executar a tarefa, mesmo com todas as orientações e treinamentos necessários, ora podemos entender que houve culpa do empregador que, pela falta de manutenção nos equipamentos ou até pelas condições físicas do empregado, cuja exaustão na jornada de trabalho e na monotonia da atividade, proporcionou o acidente.
Assim, o acidente do trabalho, por si só, é insuficiente para gerar a obrigação indenizatória por parte do empregador, pois, somente se verificará a obrigação de ressarcir os danos quando na investigação da causa, ficar comprovado que este dano é conseqüência direta e imediata (nexo de causalidade) de uma atuação dolosa ou culposa do empregador.
Dentre as considerações apontadas nos acórdãos da Justiça do Trabalho, mencionamos algumas a seguir:
“RESPONSABILIDADE CIVIL- ACIDENTE DE TRABALHO – PROVA DA CULPA DO EMPREGADOR – NECESSIDADE. Responsabilidade civil – Acidente de trabalho – Ato ilícito – Indenização de direito comum – Culpa do empregador não demonstrada – Recurso provido. A obrigação de indenizar do empregador, por acidente de trabalho, somente se corporifica quando caracterizados o dano, sofrido pelo empregado, o dolo ou a culpa do empregador e o nexo etiológico entre ambos. Não logrando o obreiro demonstrar que o evento resultou de ação culposa atribuível ao empregador, improcede a ação indenizatória, permanecendo o fato dentro da esfera do risco próprio da atividade empresarial, coberto pelo seguro social.”(Ac un da 4.ª C Civ do TA PR – PR 38.377-7 – Rel. Juiz Mendes Silva, Convocado – j 21.08.91 – DJ PR 06.09.91).
“…Disse o acórdão regional que a vítima sofreu o acidente quando estava, na qualidade de empregado, executando um trabalho de interesse do empregador, não havendo dúvida, portanto, de que o acidente teve relação com o vínculo de emprego. Destacou, ainda, que a atuação culposa da empresa ficou evidenciada pelo fato de ter permitido que um funcionário seu, sem qualificação específica, realizasse um serviço de alto risco, sem disponibilizar os equipamentos que garantissem a sua integridade física…” PROC TST RR-566/2005-038-12-00.1.
“…No caso sub judice, o perito da Previdência Social, através do laudo de fls. 122, concluiu que a recorrente é portadora de tendinite calcificante do ombro, existindo incapacidade laborativa temporária em face desta doença, mas que a mesma não poderia ser enquadrada como doença do trabalho, posto não haver nexo causal entre o aparecimento da moléstia e as atividades exercidas pela autora em seu trabalho. Tanto isso é verdade, que foi concedido à segurada benefício de auxílio-doença, conforme se observa do citado laudo…” PROC. N.º TRT – 01792-2002-010-06-00-4;
“…Evidenciado está o nexo de causalidade entre o acidente que vitimou o empregado e a atitude negligente da empresa, em virtude da atividade de risco, posto que envolvia o carregamento de madeiras pesadas, tanto que necessitava de 02 (dois) trabalhadores para a sua realização.
Assim, cabalmente provado o nexo de causalidade entre o dano e a conduta do ofensor, bem como a existência do ato tido como ilícito, por imperativo legal se torna induvidoso o deferimento da indenização pretendida, restando, então, a quantificação em valores monetários…” PROCESSO TRT Nº 00288.2005.092.14.00-77.
“…Atente-se ainda que, o Sr. Perito, ao responder os quesitos formulados pelo Juízo a quo (fls. 224), em seu item 4, declina textualmente: “O agente etiológico da patologia que acometeu o reclamante, passa de pessoa em pessoa, pelo contato direto com respingos de saliva e da fala das pessoas contaminadas (as gotículas de Flugger) pode manifestar-se com o organismo debilitado, sem imunidade, mas não podemos afirmar com certeza que a doença tenha sido adquirida ou não no local de trabalho.”
Diante de tais fatos, entendo que não restou sobejamente comprovado o nexo de causalidade entre a doença adquirida pelo autor e as condições de trabalho a que estava submetido, de modo a ensejar a estabilidade por ele perseguida na presente demanda.
Provejo o apelo, no particular, a fim de, não reconhecendo a existência de doença profissional equiparada a acidente de trabalho, indeferir o pedido de estabilidade provisória do autor…” PROC. N.º TRT – 00118-2002-019-06-00-0.