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quarta-feira, novembro 20, 2024

Cinema Americano no Pós Guerra

Autoria: Daniela Haerter

Cinema Americano no Pós Guerra – Análise dos Filmes ‘Matar ou Morrer’ e ‘Imperdoavéis’

Salvador / 2002

Introdução

Muitos historiadores e estudiosos de cinema concordam que o western é um gênero típico do cinema norte-americano. Coube ao cinema transformar o gênero em lenda tendo como cenário a conquista do Velho Oeste. Cowboys, xerifes, bandidos e índios escreveram, com enorme sucesso, seus nomes na história, tendo sempre como tema a eterna luta do bem contra o mal.

Esse trabalho tem como objetivo ilustrar características importantes do gênero para a história do cinema, principalmente em seu período pós-guerra, além de analisar o mito do cowboy associado a dois filmes: “Matar ou morrer” e “Os Imperdoáveis”.

O gênero western

O western nasceu como uma representação mítica de um fato histórico: a conquista dos territórios do Oeste e o nascimento da nação americana. Pode-se dizer que o western é um gênero de caráter épico, inspirado nos episódios da grande marcha colonizadora em direção ao Oeste. São comuns temas como a Guerra de Secessão, lutas com os índios, a corrida do ouro, banditismos e outros.

O Gênero traz em si uma mitologia baseada nas raízes da história americana, no folclore e nas canções populares. Muito antes da invenção do cinema nomes como Wyatt Earp, Billy the Kid e Buffalo Bill eram cantados com a naturalidade simbólica do folclore.

Muitos historiadores reconhecem o filme “The great Train Robbery” (1903) de Edwin S. Porter, como o primeiro western da história. Os historiadores discutem se o grande sucesso do filme foi motivado pelo gênero ou pelo fato de Ter sido um filme de maior duração, narrado com uma linguagem cinematográfica mais elaborada que a habitual , e ainda por exibir, em seu final, um plano aproximado do cowboy dando tiros em direção à platéia.

O tom triunfal desses filmes prosseguiria no decorrer dos anos 30, após o advento do cinema sonoro. Em 1939, John Ford, que ficou conhecido como mestre do gênero, realiza o filme “Nos tempos das diligências”.

Nos anos 40 , durante o período do pós guerra Hollywood surge como uma indústria que alcança uma enorme prosperidade. A vitoria dos Aliados permite a conquista de novos mercado como Japão, Itália e a Alemanha Ocidental. Porém ,em 1947, o Comitê De Atividades Anti-Americanas começou uma investigação sobre o comunismo em Hollywood. Muitos homens foram julgados e condenados á prisão. A partir daí muitas pessoas foram cassadas e impedidas de trabalhar pelo Comitê por suspeita de comunismo. Durante esse período muitas personalidades de prestígio dentro da indústria da Sétima Arte tiveram que emigrar da América para outros países, principalmente na Europa.

A chamada “Caça as Bruxas” do senador McCarthy é um dos fenômenos mais escuros dos Estados Unidos durante o século XX. Esse foi um fenômeno típico da Guerra Fria, da divisão entre dois blocos ( o capitalista, liderado pelos Estados Unidos, e o comunista da União Soviética ). Em outubro de 1947 dez diretores ( os Dez de Hollywood) foram chamados para interrogatório e os que se recusaram a responder ás perguntas foram condenados á prisão por um ano. Em 1951 as investigações foram reavivadas e cerca de 214 pessoas perderam seus empregos no mundo do cinema e muitos outros foram condenados ao ostracismo.

Para o cinema americano a anterior prosperidade foi dando lugar a uma fase negra agravada pela popularização da televisão e uma perda progressiva de espectadores.

Mesmo assim o cinema continuou a produzir e em 1952, o também perseguido diretor Fred Zinneman faz do western um veículo para sua visão da sociedade americana e alcança grande êxito com o filme ” Matar ou morrer “.

Filme “Matar ou morrer” (1952)

Story-line – Figura de um xerife que personifica o ideal de herói ao enfrentar ,sozinho, bandidos que querem matá-lo.

Sinopse – Baseado em The Tim Star, de John Cunningham, o filme conta uma história de vingança onde um xerife, no dia de seu casamento, recebe a notícia de que um bandido que ele havia prendido anos atrás estava voltando para matá-lo.

Ao invés de ir embora com a esposa o xerife decide ficar e lutar com inimigo pela paz e ordem da cidade. Porém, devido ao medo e respeito da população pelo bandido, se vê sozinho nesse conflito, incorporando o papel do herói solitário e abandonado a própria sorte.

Características – Muito mais que um western, este filme, segundo Claude Baylie, ensaísta francês, pretende ser uma parábola sobre a coragem individual diante da covardia coletiva. Pode ser também, como já comentado acima, uma paráfrase ao horror macartista na sociedade americana.

O filme possui uma estrutura narrativa com um absoluto respeito à unidade de tempo, que serve para potencializar o suspense á medida que a hora fatal vai chegando. ” Matar ou morrer” é um filme sólido e que contraria características tradicionais do gênero pois não se apoia totalmente na ação física. Para sinalizar o avanço temporal, é mostrado sempre um plano de detalhe de algum relógio onde se encontre o personagem. A dimensão psicológica dos personagens adquire, nesse filme, uma grande importância: a descrição minuciosa da conduta de cada um, a crescente angústia do xerife situado entre a obrigação moral e o instinto de conservação. O diretor pretende refletir, através disso, uma época em que muitos setores do país ficaram paralisados pelo medo, ao contrário de outros poucos, que assumiram sozinhos suas graves responsabilidades morais.

“Matar ou morrer” tem uma iluminação bastante funcional, inserida nas situações dramáticas, assim como a música de Dimitri Tiomkin, cujo tema principal se torna um clássico da música para cinema e serve para narrar, no início e em partes do filme, o sentimento do xerife.

Filme ” Os imperdoáveis” (1992)

Story-line – O filme conta a estória de um homem atormentado pelo seu passado de crimes e pela morte da mulher que o salvou desse mundo cruel.

Sinopse – Bill Munny é um matador que abandonou a bebida e o crime ajudado pela esposa. Depois da morte dela Bill se vê sem dinheiro e precisando cuidar de seus filhos. Surge então a proposta de fazer um último serviço: matar dois homens que teriam, cruelmente, desfigurado a facadas uma prostituta. Atrás da recompensa oferecida pelas mesmas Bill parte em companhia de um jovem que não enxerga bem e de seu parceiro veterano para executar o serviço. Entretanto, eles terão também que enfrentar o autoritarismo do xerife Little Bill que não permite a entrada de armas em sua cidade.

Características – ‘Os imperdoáveis” é um filme que tem uma narrativa clássica e com todos os ingredientes clássicos do gênero, porém a diferença está no tratamento dado ao tema. Com diálogos simples mas eficientes, o roteiro foge dos clichês e consegue questionar mais do que o mito do cowboy; ele questiona o mito norte-americano. O drama psicológico e existencial do personagem principal é muito forte, assim como a figura do xerife que, superficialmente, representa um homem simples e determinado, mas que aos poucos vai se revelando um matador frio e vaidoso.

O filme é considerado um marco da produção moderna no gênero western e traz como características marcante do gênero os grandes planos gerais, a figura dos heróis solitários e uma trilha sonora bem marcada e concisa.

O mito do cowboy

Sobre a base da realidade histórica, o western, de fato, construiu uma mitologia .Nele, o “cowboy” é elevado à dignidade de mito: o mito do homem livre, próximo de suas raízes telúricas e captadas num estado nascentes da sociedade, à qual tem de impor, pela força, a ordem e a prosperidade.

De acordo com o crítico francês André Bazin, na origem do mito há uma ética da epopéia e da tragédia. Os heróis do “western”, forjados à medida do homem (medida essa que contrasta com a grandeza legendária de seus empreendimentos)são acompanhados de um estilo de encenação grandiloqüente, que traduz o espírito épico nas composições das imagens, na predileção pelos vastos horizontes; os próprios títulos dos filmes quase sempre propõem e recordam o confronto do homem com a natureza. A base mítica do “western” reforça-se, por exemplo, pela simplicidade elementar do caráter das personagens e pela carga simbólica de cada uma. Basta que se perceba a clara divisão dos mundos masculino e feminino: no primeiro reinam a sabedoria, a coragem, a prepotência; no segundo, a fragilidade, o espírito de sacrifício e não raramente a futilidade. Ainda segundo Bazin, a mulher é a “vestal das virtudes sociais”. Esposas, irmãs, noivas, têm funções autônomas a cumprir e objetivos distintos a atingir. Mas, de acordo com Robert Warshow, as prostitutas formam uma exceção, podendo dividir a visão de mundo do herói porque gozam de uma “independência quase masculina, não pertencem a ninguém e, diferentemente da mulher honesta, não constituem um valor que deva ser protegido”, assim como acontece no filme “Os imperdoáveis”.

Conclusão

O western representou um grande momento da história do cinema e, principalmente, da indústria hollywoodiana e da história dos Estados Unidos. A historiadora americana Eliza Franklin escreveu na década de 50 : ” O western foi o primeiro gênero cinematográfico a aparecer, o primeiro no coração do público cinematográfico de todas as idades por cerca de vinte anos, e o primeiro nos corações das crianças por quase cinqüenta anos. Possui ainda atração para os jovens e está agora recapturando a platéia adulta. Isto é um recorde de duração e execução que poucas vezes tem sido igualado por qualquer outro tipo de entretenimento”. Muitos avanços e créditos devem ser dados ao gênero western que, assim como os outros gêneros e elementos da história do cinema, nos fazem aprender, compreender e apreciar a arte que é fazer um filme.

Bibliografia

MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas e pós-cinemas. Ed. Papirus, Campinas,1987

BAZIN, André. O cinema. Ed. Brasiliense, São Paulo, 1991

XAVIER, Ismail. O cinema no século. Ed. Imago, Rio de Janeiro, 1996

SADOUL, Georges. História do Cinema Mundial. Ed. Martins

COSTA, Antônio. Compreender o cinema. Ed. Globo, São Paulo, 1989

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