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segunda-feira, dezembro 2, 2024

Gestantes HIV positivas e sua não-adesão à profilaxia no pré

RESUMO

Este é um estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa. Investigamos a não-adesão de gestantes portadoras do vírus HIV/AIDS ao tratamento preconizado pelo Ministério da Saúde no período pré-natal. Os sujeitos desta pesquisa foram sete mulheres soropositivos, que, durante a gestação, não aderiram ao tratamento profilático recomendado. Os dados foram coletados por uma entrevista semi-estruturada. Para a análise dos dados, elaboramos categorias com base nas falas destes sujeitos. Com os resultados, observamos que existe a vulnerabilidade da mulher em realizar a negociação do sexo seguro com o seu parceiro e que associado às baixas condições socioeconômicas, desemprego e falta de afeto, faz com que as mulheres se tornem vítimas doHIV/AIDS.

Descritores: Gestantes; Saúde da mulher; Sorodiagnóstico da AIDS; Cuidado pré-natal.


ABSTRACT

This is an exploratory study based on a qualitative approach. The objective was to investigate why HIV positive pregnant women do not follow the treatment which is recommended by the Health Ministry during the prenatal period. The individuals participating of this investigation were seven HIV positive women who, during their pregnancy, did not follow the prophylaxis treatment currently recommended. The data were collected by means of semi-structured interviews. Categories based on what these individuals reported were then stipulated and the results showed that women are in a vulnerable position regarding the negotiation of safe sex with their partners. Moreover, low social and economical conditions and lack of affection lead women to become victims of HIV/AIDS.

Descriptors: Pregnant women; Women’s health; AIDS serodiagnosis; Prenatal care.


RESUMEN

Este es un estudio exploratorio descriptivo con abordaje cualitativo. Se buscó investigar a la no adhesión de las gestantes portadoras del vírus HIV/SIDA al tratamiento preconizado por el Ministério de la Salud en el periodo prenatal. Los sujetos de esta encuesta fueron siete mujeres seropositivas, que durante la gestación, no se adhirieron al tratamiento profiláctico recomendado por el Ministerio de la Salud. Los datos fueron colectados por las autoras del estudio, a través de una entrevista semiestructurada. Para el análisis de los datos, elaboramos categorías desde lo que expresaron estos sujetos. Con los resultados observamos que existe la vulnerabilidad de la mujer en realizar negociación del sexo seguro con su compañero y que asociado a las bajas condiciones socioeconómicas, desempleo y falta de afecto, hace con que las mujeres se conviertan en víctimas del HIV/SIDA.

Descriptores: Mujeres embarazadas; Salud de la mujer; Serodiagnostico del SIDA; Atención prenatal.


1. INTRODUÇÃO

No início dos anos 1980, surge para a humanidade uma doença que não fora previsto pela ciência. Situa-se no campo da saúde, mas logo depois da sua notoriedade, constata-se que ultrapassa os limites do processo saúde doença, ocasionando um dos maiores problemas no contexto da saúde pública. Surge a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida AIDS – e o seu agente causador, o Vírus da Imunodeficiência Humana HIV(1).

Passadas mais de duas décadas do aparecimento da AIDS, podemos afirmar que sua trajetória ainda está marcada pelo desconhecimento em relação à doença, pelo preconceito e pela discriminação aos portadores. Isso ocorre porque se trata de uma doença altamente letal, principalmente no início de sua descoberta. Atualmente, encontra-se como uma doença crônica, mas que avança drasticamente pela população feminina e especialmente em mulheres em idade reprodutiva.

No Rio Grande do Sul, em 1987 tínhamos quatorze homens infectados para uma mulher, e esta diferença está diminuindo, chegando já a um para um, o que demonstra o significativo aumento de casos entre mulheres em nosso Estado(2). A grande parte de mulheres infectadas, encontra-se em idade reprodutiva, resultando em um aumento de crianças nascendo portadoras do vírus HIV através da transmissão vertical.

Tendo em vista esta realidade, em outubro de 2003, o Programa de Nacional de DST e AIDS revisaram as Recomendações de Terapia Anti-Retroviral (TARV) para gestantes, considerando que essas intervenções (aconselhamento + TARV) estejam disponíveis para toda a população de gestantes infectadas pelo HIV e seus filhos, uma vez que estudos mostram que a taxa de transmissão vertical do HIV, sem intervenção, situa-se em torno de 20%, e, com as medidas tomadas, reduz para zero e 2%(3). O acesso às ações de aconselhamento é um direito de toda a gestante/parturiente, possibilitando o conhecimento e, conseqüentemente, a correta adesão ao tratamento proposto.

Mesmo possuindo acesso aos programas de saúde, observamos nos serviços onde atualmente trabalhamos, um grande número de gestantes portadoras do vírus HIV que não realizaram um pré-natal adequado. Enfrentando, portanto, dificuldades para seguir o tratamento proposto.

Sendo assim, esta pesquisa tem como objetivo investigar o processo de não-adesão das gestantes portadoras do vírus HIV à profilaxia no pré-natal, recomendada pelo Ministério da Saúde durante o pré-natal.

2. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa. Esta metodologia foi escolhida como mais adequada, pois há interação com a realidade estudada. A pesquisa qualitativa corresponde às informações mais profundas dos processos estudados, questões particulares: trabalha-se com sentimentos, crenças e atitudes do sujeito(4).

Os sujeitos deste estudo foram sete mulheres portadoras do vírus HIV que, durante a gestação, não aderiram ao tratamento profilático recomendado pelo Ministério da Saúde. Elas residem na grande Porto Alegre, buscaram o serviço Obstétrico do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, por ocasião da internação para ganharem seus filhos e foram submetidas ao teste rápido, no período de março a maio de 2005.

Escolhemos este hospital por ser referência para 29 postos de saúde da capital, ser de grande porte, universitário, de natureza filantrópica, realiza 300 partos/mês, incluindo o SUS e convênios. Sua maternidade também está cadastrada no Projeto Nascer e trabalha em consonância com o Programa de Humanização do pré-natal, parto e puerpério em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre.

Todos os sujeitos foram convidados a participar desta pesquisa, cujos objetivos foram esclarecidos para eles de forma simples e clara. Também lhes foi garantida a confidencialidade de todos os dados, deixando, contudo, liberdade de escolha em participar, tendo sido assegurado que, se desistissem da pesquisa, não haveria nenhum prejuízo no seu tratamento(5). Foi solicitado aos que concordaram em participar deste estudo que assinassem o termo de consentimento livre e esclarecido, do qual cada participante recebeu uma cópia, atendendo às diretrizes e normas da Resolução nº. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Para determinar o número de participantes, baseou-se na saturação de dados que, conforme(6) “refere-se à sensação de fechamento, vivenciada pelo pesquisador, quando a coleta de dados pára de produzir novas informações”.

Os critérios de inclusão foram estar no Alojamento Conjunto, em estágio puerperal e com o recém-nascido vivo, ser maior de idade, independente de escolaridade, paridade, atividade ocupacional, credo, raça, estado civil ou classe social. Já os critérios de exclusão foram mulheres em estágio puerperal, HIV positivas, menores de 18 anos e as maiores de idade que aderiram ao tratamento preconizado pelo Ministério da Saúde, durante sua gestação.

O instrumento de pesquisa apresentou questões norteadoras, que serviram como um roteiro previamente elaborado, abordando questões sobre a não-adesão da cliente ao tratamento preventivo da transmissão vertical.

Os dados foram coletados pelas autoras do estudo, na instituição anteriormente referida, mais especificamente na maternidade, com mulheres durante o puerpério imediato, ou seja, nos primeiros 10 dias pós-parto. O contato para a efetivação da entrevista ocorreu no período que antecedeu a alta da paciente, somente após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Para a análise, seguiremos a proposta sugerida pela autora(7), na qual se organiza o material a ser analisado. Assim, definimos dados que se destacam e, após uma exaustiva leitura, identificamos o que surgiu como relevante nesses dados e elaboramos as categorias específicas.

O projeto de pesquisa foi encaminhado em novembro de 2004 para a Comissão Científica e posteriormente ao CEP (Comitê de Ética e Pesquisa) do Hospital São Lucas da PUCRS, que avaliou e autorizou a realização da pesquisa.

3. RESULTADOS

Para proceder uma análise mais contextualizada, apresentamos o perfil demográfico dos sujeitos participantes. De acordo com a raça, quatro sujeitos são da raça branca e três da parda. Todos com baixo índice escolar, possuindo apenas o primeiro grau incompleto. São cinco moradoras da cidade de Porto Alegre e duas oriundas da Grande Porto Alegre. E em sua totalidade são multíparas, com uma média de seis gestações cada uma. Entre os sujeitos entrevistados, o número de consultas de pré-natal ficou na média de duas consultas ao longo da gestação.

Desta pesquisa emergiram as seguintes categorias:

– Ausência de planejamento familiar;
– Dificuldade em realizar o pré-natal de alto risco;
– Negação da doença;
– Falta de autocuidado.

Para a análise dos dados qualitativos, buscamos estabelecer uma compreensão de todas as informações obtidas. Os dados obtidos nos deram uma visão mais realista sobre o motivo da não-adesão das gestantes ao tratamento adequado durante o pré-natal, permitindo articular essas informações no nosso cotidiano profissional.

Tivemos como finalidade ampliar nossos conhecimentos sobre o motivo da não-adesão das gestantes ao tratamento adequado durante o pré-natal e articular essas informações com o contexto atual.

3.1 Ausência de Planejamento Familiar

As participantes da pesquisa, ao serem questionadas sobre a realização do pré-natal informaram que não se sabiam grávidas, portanto, procuraram os serviços de saúde tardiamente, reforçando que não houve planejamento nas gestações. Visto que essas mulheres se descobriram grávidas quando alguns sinais já estavam evidentes, como o atraso menstrual por vários meses como refere esta paciente:

“Não fiz o pré-natal completo, pois demorei para ter certeza que estava grávida” (A1).

Realizei pré-natal só no final da gestação, nem sei quantos meses eu estava, acho que uns cinco meses. (…) Eu poderia ter feito corretamente, né? Mas eu não sabia que estava grávida, pois eu ficava dois, três meses sem menstruar e depois descia. Desta vez aconteceu a mesma coisa, então eu não dei bola (A2).

Estas afirmações nos levam a observar a falta de percepção dos sujeitos desta pesquisa, sobre o seu corpo e sexualidade, como se a decisão de gerar um novo ser não fosse um ato de sua responsabilidade, algo que possa ser prevenido, controlado. Uma constante ambigüidade entre querer ou não engravidar, gerando um conflito interno, que as mobiliza, mas nenhuma ação em prol da prevenção é realizada. Uma das questões mais difíceis de resolver no campo da psicologia é a relação que existe entre o que se sente e o que se faz, sendo, no âmbito da gravidez não-desejada, esta relação evidente(8).

Existem múltiplas respostas para esta ambivalência, que poderemos classificar em dois grupos. Por um lado, questões objetivas, como a falta de informações sobre os métodos contraceptivos e a dificuldade de acesso aos mesmos. Por outro, razões subjetivas que estão ligadas à sexualidade humana, sexualidade como diversão, comunicação, prazer e troca de afeto(8).

Importante frisarmos que o planejamento familiar tem por objetivo principal proporcionar aos casais informações necessárias e meios apropriados, para que possam decidir de forma livre e consciente sobre o número de filhos desejados(9). Portanto, tendo como fundamento que o conhecimento e a informação não são fins, mas meios para uma postura mais responsável perante a vida, devemos buscar mais espaços de elaboração e construção da educação sexual da população, seja em escolas, hospitais, postos de saúde, mesmo no cotidiano público e privado, com atividades dirigidas à prevenção e promoção da saúde. Somente homens e mulheres bem informados sobre o assunto podem discutir o maior agravante da vulnerabilidade da mulher que se dá pelas limitações no espaço de suas relações pessoais, principalmente no que se refere às relações conjugais.

3.2 Dificuldade em Realizar o Pré-Natal de Alto Risco

Essa categoria tem por objetivo discutir alguns aspectos que emergiram na análise do testemunho dos sujeitos, como sua posição de submissão econômica e social, desigualdades decorrentes da maneira como se organizam as relações de gênero em nossa sociedade atual, dificultando, assim, o acesso à saúde e conseqüentemente à adesão ao tratamento proposto para a prevenção da transmissão vertical do HIV.

O termo adesão ao tratamento deve ser visto como uma atividade conjunta na qual o paciente não apenas obedece às orientações médicas, mas entende, concorda e segue a prescrição estabelecida pelo seu médico. Significa que deve existir uma aliança terapêutica entre médico e paciente, na qual são reconhecidas não apenas a responsabilidade específica de cada um no processo, mas também de todos que estão envolvidos (direta ou indiretamente) no tratamento(10).

Os depoimentos dos sete sujeitos entrevistados revelaram que, além de iniciar tardiamente o pré-natal, outros fatores contribuíram para a não-realização das consultas periódicas e, por conseguinte, à não-adesão ao protocolo proposto pelo Ministério da Saúde. São elas:

– Deficiência financeira para transporte até o atendimento de alto risco;
– Demora na entrega dos resultados laboratoriais (ELISA e WESTERN BLOT);
– Falta de rede de apoio para cuidar dos demais filhos enquanto estivesse ausente para consultas e exames;
– Falha na comunicação do profissional de saúde com a gestante;
– Falta de interesse da gestante (negação).

Como observamos em algumas falas concedidas:

“a primeira consulta que foi marcada, no pré-natal de alto risco, eu perdi, eu não tinha passagem” (A2).

No Brasil, em 1998, a média de consultas de pré-natal foi de três por gestante, correspondendo à média dos sujeitos deste estudo, estando aquém da meta do Ministério da Saúde que são seis consultas. Ciente desta constatação, o Ministério, entre os anos de 1998 e 1999, promoveu várias medidas de incentivo ao pré-natal e melhoria da qualidade da assistência às gestantes. O estímulo maior ocorreu devido à inclusão do acompanhamento pré-natal nas ações básicas que devem ser desenvolvidas pelos municípios para que eles possam receber recursos diretamente do Governo Federal(11).

3.3 Negação da Doença

Outra categoria que surgiu foi a negação da doença. Muitas dos sujeitos entrevistados negaram o fato de que a doença pudesse estar presente no ambiente familiar. A desconfiança do parceiro em ser ou não HIV positivo, estar ou não tendo relacionamentos extraconjugais, ser drogadito, eram hipóteses pouco comentadas no seu âmbito familiar como refere:

Ele disse que adquiriu a doença com 18 anos pois usava droga injetável, mas que foi para a Igreja e foi curado. Ele me falou isso, mas eu não acreditei. Agora ele tem 25 anos, nós nunca usamos camisinhas, ele não gosta (A3).

Em um estudo realizado no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, SP com gestantes que descobriram serem soropositivas durante o pré-natal, muitas banalizavam a definição da doença AIDS. Isso devido à falta de sintomas, o que ocasionou a dúvida da infecção(12).

Em nossa pesquisa, após o diagnóstico de portadora do vírus, também encontramos a desinformação a respeito da doença. Poucos dos sujeitos entrevistados sabiam dos problemas que o vírus poderia ocasionar. Além disso, a falta de sintomatologia também tornava remota para elas a possibilidade de ficarem doentes, com se vê neste depoimento:

Como eu estava pensando, nós temos comida, temos verdura, frutas, vitaminas. As outras morrem porque não têm boa alimentação. Isso não é o nosso caso. Na hora da comida, tem verdura, no café tem leite… Isso é sagrado. Eu cuido muito da alimentação (A4).

Mesmo com o diagnóstico de serem soropositivas, a grande maioria das mulheres segue mantendo ativa sua vida sexual e afetiva. Em contrapartida, enfrentam dificuldades na comunicação do diagnóstico, medo de rejeição no ambiente familiar. Segundo elas, mudar atitudes e comportamentos pode desestruturar sua família(13).

E a preocupação não se restringe apenas ao ambiente familiar, mas existe uma preocupação constante com a comunidade. O medo de que os vizinhos comentem que na sua família existe alguém com HIV implica assim, em manter os comportamentos diários para não deixar transparecer a doença, principalmente por causa do preconceito, que atualmente mantém-se muito intenso, conforme:

“Acho que o pior da doença é não poder falar. Muitos têm preconceito, nós falamos pra uns e eles falam pra outros…”(A5).

3.4 Falta do Autocuidado

Identificamos esta categoria, pela constante fala dos sujeitos dizendo já saberem ou terem suspeitas de que o seu parceiro é HIV positivo e mesmo assim, mantinham relações sexuais com seus companheiros e em nenhum momento questionavam ao menos o uso de preservativo feminino. Embora fossem cientes desta informação, talvez pela baixa auto-estima, falta do cuidado com seu próprio corpo, condições sociais e econômicas baixas, a negociação do uso do preservativo era muitas vezes inviável. Conforme relato sujeito:

Ele brigava comigo e não queria usar camisinha. Coisa que eu sempre quis usar com ele foi camisinha, mas ele não usava, foram raras às vezes. Ele dizia que não gostava, para ele não era bom, não sentia nada (A4).

Uma das questões mais importantes no contexto atual é a falta da negociação do uso do preservativo pela mulher, já que este método é controlado pelos homens. Em um estudo realizado em 2003 com agentes comunitárias de saúde do Programa de Saúde da Família de Porto Alegre, elas apontaram em suas falas que a negociação para o uso da camisinha masculina solicitada pela mulher é muito complicada devido à submissão, fraqueza, passividade, dependência e sentimentalismo(14). Em contrapartida, os homens se encaixam no padrão de masculinidade, força, atividade, dominação e racionalidade.

Embora seja constante a luta feminista pelos seus direitos e igualdades na sociedade atual, o homem ainda mantém a força e a dominação da família. Este fato permanece mais presente quando falamos na população de baixa renda das cidades, porque o contexto em que estão inseridos não é apenas pobre, mas também violento.

O perfil socioeconômico das mulheres portadoras do HIV mantém-se entre aquelas com baixa ou nenhuma escolaridade, o que o acesso e a compreensão necessária para as informações(15). Os aspectos sociais, econômicos, culturais e emocionais influenciam no momento em que a mulher tem que tomar alguma decisão que implique iniciar desafios e talvez confrontar a autoridade do parceiro(16), podendo, assim, criar conflitos e situações indesejáveis. Quanto mais idade tiverem as mulheres, mais difícil se torna impor tal decisão:

“O meu primeiro marido não admite que eu tenha ido embora com as crianças. Fui embora porque ele usava drogas e me batia” (A3).

Atualmente, há propagandas veiculadas pela televisão e pelo rádio, dirigidas às mulheres para que utilizem algum tipo de preservativo para a prevenção do vírus HIV. Entretanto, ao contrário do que se espera, muitas ainda não têm o poder de negociação com o seu parceiro e são poucas as que usam os preservativos femininos.

Entre tantas dificuldades nas relações conjugais com seus parceiros, muitas dos sujeitos entrevistados conviviam também em seu cotidiano com a violência doméstica. Sabiam do contexto de violência em que seus companheiros estavam inseridos: alguns eram assaltantes, outros estavam presos por diversos delitos e outros faziam uso de drogas. Embora soubessem do risco que corriam em contrair a doença, mantinham seu relacionamento subordinado a tal violência:

“Ele foi preso, pena de 22 anos. Ele ganhou semi-aberto e fugia também. Eu sempre ia visitá-lo, meus filhos todos foram feitos dentro da cadeia” (A6).

A falta de negociação e a convivência com a violência doméstica levam a mulher a poucas opções de segurança contra a contaminação pelo vírus HIV. Estas condições de vida estão diretamente relacionadas com as questões de autocuidado e de valores que cada mulher possui. A consciência da transmissão da doença está relacionada com a disposição e o investimento que cada uma está disposta a fazer a favor do autocuidado(16).

As escolhas de novos caminhos poderão influenciar na mudança de seu cotidiano: risco de perder o parceiro, interferência no relacionamento com seus outros filhos e sua relação com a comunidade em que está inserida. Normalmente é muito difícil realizar tal mudança.

Com o objetivo de mudar estes comportamentos, os aconselhamentos sobre DST/HIV/AIDS são inseridos para alcançar o autocuidado da mulher. Num processo de consolidação da auto-estima, bem-estar dos filhos e da família, o aconselhamento vem para mudar o comportamento de risco para um comportamento seguro onde se tenha informações adequadas sobre sexo seguro e disponibilidade para o diálogo entre casais.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo vislumbra compreender as razões pelas quais muitas mulheres soropositivas têm enfrentado dificuldades para realizar o acompanhamento proposto pelo Ministério da Saúde para a prevenção da transmissão vertical do HIV/AIDS.

Por meio da análise das falas dos sujeitos participantes desta pesquisa, evidenciamos não apenas um, porém múltiplos fatores que afetam a não-adesão ao tratamento. Fatores estes que estão interligados ao seu dia-a-dia, no que diz respeito às dificuldades e enfrentamentos do seu cotidiano.

Mulheres que, devido ao acúmulo de funções, dentro e fora do lar, associadas à drogadição, à violência, ao abandono, à carência, à imaturidade afetiva e, principalmente à falta de perspectiva, têm se submetido à vulnerabilidade de infecção pelo vírus HIV. Essas questões estão relacionadas à identidade de gênero, à sexualidade, ao comportamento dos parceiros e à situação socioeconômica que reforça a sua condição de opressão, principalmente num país como o nosso, de tanta exclusão social.

A assistência às gestantes vem sofrendo mudanças importantes com o passar dos anos, com objetivo de propiciar-lhes, benefícios no atendimento do binômio mãe-bebê, por meio de tecnologia e equipe multiprofissional para detecção de problemas precocemente. No entanto, a falta de consciência das mulheres sobre o seu verdadeiro papel social, e não os que lhe é atribuído socialmente, juntamente com as dificuldades econômicas, levam-nas a não buscar o acesso ou até mesmo a não usufruir um atendimento como o pré-natal.

REFERÊNCIAS

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