HOTELARIA BRASILEIRA: HOSPITALIDADE COMO VANTAGEM COMPETITIVA
Luiz Cesar de Miranda (UNIESP)
[email protected]
Resumo
A hotelaria brasileira é eminentemente de familiar e enfrenta atualmente a concorrência das grandes redes hoteleiras internacionais que chegam ao mercado brasileiro com arquitetura arrojada e preços competitivos. Devido às próprias caracterrísticas da administração familiar, o profissionalismo e a pouca preocupação com os concorrentes quase inexistentes, até então, nunca foi dado o devido valor. Diante dessa realidade, os hotéis independentes se vêem forçados a se profissionalizar e investir em melhoramentos na estrutura física e tecnológica. No entanto, o lado humano da hotelaria é pouco visto se compararmos a sua importância junto ao processo de fidelização do hóspede aos hotéis. Este artigo tem por finalidade analisar a situação da hotelaria independente frente a concorrentes poderosos da hotelaria de rede e mostrar que juntamente às inovações tecnológicas, a hospitalidade deve ser o requisito
básico para a permanência no mercado de trabalho. O papel do setor de recursos humanos também é revisto e dado a sua importância como o setor que deve estar ligado ao plano estratégico do hotel no intuito de melhorar a produtividade dos colaboradores por meio do conhecimento mais profundo das necessidades dos mesmos.
Abstract
Brazilian hotels are most from family enterpreneurs and are facing the greatests international hotels brands that arrived in Brazil market with modern architecture and competitive prices. Until nowadays, due to the family’s administration ccharacteristics, professionalism and no worry about their few opposers have never been a priority. In this new reality, the independent hotels are pushed to be prepared and invest in physical structure and technology. Hotel human side is few paid attention, though, if its importance is compared to the guests fidelity process in the hotels. This paper has the goal to analyze the independent hotels situation when facing their powerful competitors from the international hotel nets and show up that joining technological innovations, the hospitality must be a basic requirement to market maintenance. Human Resource’s role is also renewed and given its importance as a department that must be linked to the hotel strategic plan with the objective to improve the worker’s productivity through a deeper knowledge of their needs.
Palavras-chaves: Hotelaria independente; Hospitalidade; Recursos Humanos; Treinamento.
1. Introdução
Nas últimas décadas o turismo no Brasil tornou-se um papel importante na economia do país. Muitas ações foram tomadas tanto por parte do governo como pelas empresas privadas no intuito de incrementar o número de turistas no país. Algumas dessas ações não tiveram muito sucesso, mas, de qualquer maneira, houve um sensível aumento de entrada de turistas estrangeiro, assim como, o brasileiro passou a viajar mais pelo seu país.
Diretamente ligado a esse processo, está a hotelaria no país. Despreparados e sem profissionalismo algum, a malha hoteleira se viu obrigada a reavaliar o seu papel no mercado e a mudar de estratégia. Novas bandeiras apareceram, novos turistas também e a hotelaria “sucateada” brasileira se viu obrigada a tomar novos rumos. Aqueles que conseguiram sobreviver estão enfrentando dificuldades para enfrentar concorrentes preparados, com conforto e preço.
Aqueles que não agüentaram, resolveram fechar as suas portas e mudar de ramo de atividade. Neste artigo, foi feito um levantamento bibliográfico sobre a situação da hotelaria independente no Brasil, assim como sobre novas possibilidades de vantagens que poderiam ajudar na concorrência do mercado. A hospitalidade é uma dessas vantagens e foi apresentada como um diferencial na hotelaria.
Vale enfatizar que a preocupação deste artigo está nas regiões mais distantes do país. Regiões que começam a vislumbrar o turismo como possibilidades de emprego e crescimento econômico para o local, que antes, não era nem cogitado. Regiões como Centro-oeste, norte e nordeste do Brasil cuja hotelaria independente ainda é forte, mas que começa a receber as ameaças das redes internacionais. Porém, é uma realidade brasileira que pode ser analisada em
qualquer parte do país.
Na primeira parte, o leitor terá uma idéia sobre a atuação da hotelaria independente no Brasil. Algumas análises sobre o perfil do turista no Território Nacional e a mudança de comportamento dos mesmos. Para isso, foram realizadas pesquisas bibliográficas sobre os aspectos históricos e conceituais que pudessem subsidiar as considerações apresentadas.
Em seguida, são analisadas as ameaças que o hoteleiro brasileiro enfrenta e apresenta a hospitalidade como uma vantagem competitiva para a permanência do turista na localidade. Estudos de autores já reconhecidos nacional e internacionalmente sobre o assunto foram analisados para que o autor chegasse às afirmações aqui apresentadas. Também é repensado o papel do setor de Recursos Humanos no hotel e como poderia ajudar no processo de mudança de
cultura e comportamento organizacional e o autor termina o artigo com suas reflexões sobre o assunto levantado.
2. Breves comentários sobre a hotelaria no Brasil
Se analisar a história da hotelaria brasileira, é possível verificar que sempre está atrelada ao empreendimento familiar e como uma opção secundária de incremento financeiro para seu proprietário, que já tinha uma outra fonte de renda. No entanto, a partir da segunda metade do século XX que realmente se percebe maior interesse no setor hoteleiro e na sua profissionalização. Nos anos 90, com a guerra do Golfo, começa uma crise econômica nos Estados Unidos,
fazendo com que as redes hoteleiras busquem novas opções de investimentos. Os mercados emergentes são o alvo para o investidor. O Brasil, com uma política econômica recuperada e moeda mais forte, é um desses mercados e se beneficia com a entrada de novas redes no país. Fundos institucionais, construtoras e incorporadoras imobiliárias tornam-se novos agentes econômicos para o desenvolvimento hoteleiro, surgindo o formato de apart-hotéis, flats e
condomínios hoteleiros (AMARAL e CARVALHO, 2004). Outro fato que também influenciou a hotelaria brasileira foi a mudança do perfil do nosso
turista. Até então, as viagens internacionais eram dispendiosas se comparasse com os gastos no turismo interno. Dias e Pimenta (2005, p. 53) dizem que “o aumento do nível de exigência do consumidor faz parte de um irreversível processo evolucionário do mercado, com clientes que, além de maior acesso à informação, têm facilidades de transportes e viajam mais, dispondo de elementos para comparação”. Com a estabilização da moeda e equilíbrio econômico, os brasileiros viajam mais e criam novas necessidades e desejos. O que antes uma boa cama e um banheiro higienizados eram necessários para o turista, atualmente isso não basta para a satisfação do hóspede. As marcas internacionais passaram a ser sinônimo de qualidade de serviço causando um desconforto à hotelaria independente e obrigando a renovação e mudanças de atitudes.
Graças a esse novo perfil de demanda e a concorrência com as redes internacionais que entram no país com qualidade e preços baixos e competitivos, há o aumento do parque hoteleiro e os hotéis independentes investem na melhoria do produto (AMARAL e CARVALHO, 2004). Como conseqüência, regiões como São Paulo, Curitiba e Belo Horizonte sofrem com a concorrência e o mercado com super oferta. A entrada da hotelaria econômica de rede trouxe uma realidade não esperada pelo empresário da hotelaria independente, acostumados a não ter concorrentes tão fortes quanto ao Ibis e Formule 1, por exemplo, que chegam com arquitetura arrojada, pouquíssimos serviços, mas com preços baixos, tirando a clientela de muitos hotéis independentes. Sobre o hotel Formule 1 e o Íbis , da rede Accor, a revista Hotelnews (2005, p.33) publica na sua edição de março/abril o seguinte:
“Neste ano (2005), novos hotéis serão abertos em São Paulo (centro e Barueri) e no Paraná (Curitiba). Nos próximos dois anos, serão inaugurados em Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro, Salvador (BA), Belém (PA) e na capital paulista. […] Também estão previstos novos Íbis, em cidades com mais de 300 mil habitantes. Atualmente, são 33. Em dois anos, deverão ser 60.”
Mesmo com o mercado competitivo e sem o crescimento da demanda na mesma proporção que da oferta, de acordo com a Hotel On Line em 2003, 91,8% dos meios de hospedagem do Brasil é hotelaria independente, 5,5% de redes nacionais e somente 2,7% de redes internacionais. Se observar em números de unidades habitacionais, a maioria delas é pertencente às redes hoteleiras (AMARAL e CARVALHO, 2004).
Essa proporção se reproduz em todo território brasileiro. Uma pesquisa realizada pela HVS International (apud AMARAL e CARVALHO, 2004) no ano de 2004, mostra coma anda a participação das redes nos principais mercados do país (quadro abaixo). É importante notar que somente nas cidades de maior concorrência, que a hotelaria de rede tem uma participação maior que 20% (casos de São Paulo e Brasília, e Rio de Janeiro com 19%). O restante do território
nacional, até mesmo dos mercados fortes no turismo de lazer (Fortaleza, Salvador e Recife) e que são atrativos interessantes ao turista internacional, a hotelaria independente ainda é a maioria. Isso só vem a corroborar com a necessidade de uma reestruturação dessa hotelaria, que em muitos locais, ainda não se profissionalizou suficientemente para enfrentar uma concorrência acirrada quando as redes reconhecidas internacionalmente resolverem expandir seus negócios para essas regiões. Pode estar hoje em maioria, mas a tendência é de expansão do turismo por todo o país e, com isso, abrirá espaço aos grandes hoteleiros se estabelecerem nos mercados em desenvolvimento. O cenário pode se reverter se nada for feito com o intuito de se preparar para uma nova realidade.
Tabela 1
Participação das redes internacionais em importantes mercados urbanos (por número de UHs)
Fonte: HVS International, (apud AMARAL e CARVALHO,2004)
3. Ameaças e possíveis saídas
As ameaças que a hotelaria independente está enfrentando e enfrentará, dependendo da região brasileira em que se for discutir, estão basicamente em dois aspectos: as redes hoteleiras e a si próprio.
O primeiro é na entrada de concorrentes já estabelecidos no mercado hoteleiro com bandeiras reconhecidas perante a demanda do local, como são os casos das redes com os hotéis econômicos, e que possui uma estrutura organizacional e de administração prontas para entrar em novos mercados. Trabalham com poder de compra e venda bastante fortes, pois existe um suporte eficiente nos canais de distribuição e negociações com fornecedores. Normalmente o custo em
que trabalham são menores devido às compras serem centralizadas para todos os hotéis da bandeira, conseguindo melhores preços. Assim como seus canais de distribuição estar a alcance de qualquer turista que desejar se hospedar no seu estabelecimento. Segundo, a própria maneira de gestão da hotelaria independente e familiar que pode ser como um escorpião que se mata com o próprio veneno. Certamente, esta é a pior que se pode enfrentar porque envolve cultura organizacional bastante enraizada e de difícil mudança. Pressupõe mudanças de comportamento gerencial e possíveis acomodações já estabelecidas.
Sobre o assunto, Oliveira diz que “Ameaças são forças ambientais incontroláveis pela empresa familiar, que criam obstáculos a sua ação estratégica, mas que poderão ou não ser evitadas, desde que reconhecidas em tempo hábil” (OLIVEIRA, p.55, 1999). O problema está na questão do tempo hábil. Muitas vezes o momento em que se reconhece a ameaça já não há tempo suficiente para reverter uma situação. O que fazer, então, com essas ameaças? É possível que se encontre uma solução para tais problemas ou a hotelaria independente está fadada a ser extinta? Na verdade, a solução está no óbvio que é buscar analisar friamente, sem colocar sentimentalismos ou concessões devido a laços familiares envolvidos, e tomar decisões que realmente são necessárias para o crescimento do seu empreendimento.
Buscar descobrir as vantagens competitivas que o seu hotel tem e que possa estar ajudando perante a concorrência. Sobre esse assunto Roberts ( 2001, p. 111-121) coloca como sendo vantagens competitivas toda ação que possa estar marcando o empreendimento. Um toque especial no atendimento, habilidades e competência do staff, qualidade no serviço ou um aspecto mais real como o desenho arquitetônico, gerenciamento estratégico, localização, formas de
distribuição entre outros. Deve-se então, descobrir quais as vantagens que possui para o alcance dos resultados.
4. A hospitalidade como vantagem competitiva
Uma opção que pouco é entendido pela maioria das pessoas é a hospitalidade. Provavelmente o seu significado está no imaginário das pessoas como sendo o receber bem o visitante dentro da sua casa ou do sua cidade, porém, a sua abrangência é muito maior que se possa imaginar.
Camargo (in BUENO e DENCKER, 2003, p.19) divide as categorias da hospitalidade em doméstica, pública, comercial e virtual. A hospitalidade em que a hotelaria se encontra certamente é a comercial, pois envolve a troca pecuniária pelo serviço de hospedagem prestado.
No entanto, isso não pode significar a “frieza” no comportamento daquele que recebe devido ao pagamento financeiro pelo bem receber.
Grinover (2002, p.26) define hospitalidade como sendo o “ato de acolher e prestar serviços a alguém que por algum motivo esteja fora do seu local de domicílio.”. Completando a definição anterior, Lashley (2004,p.21) diz que “ o entendimento mais amplo a respeito da hospitalidade sugere, em primeiro lugar, que esta é fundamental, o relacionamento construído entre anfitrião e o hóspede” e Camargo (2003,p.15) completa dizendo que “[…] nada representa a
hospitalidade que o ato de acolher pessoas que batem à porta”. Buscar o aperfeiçoamento do saber receber seus hóspedes significa a atenção que se dá para os mesmos. A maneira de como falar e se dirigir ao cliente passa a ter mais importância que o processo de trabalho em si. Saber operar máquinas e equipamentos também tem seu valor, mas não se deve valorizar esse aspecto em detrimento a hospitalidade oferecida às pessoas.
Castelli (2000, p.50) lembra que “um dos entraves para a modernização das empresas hoteleiras, chama-se falta de investimento na educação e no treinamento dos recursos humanos”. Isso vem colaborar com a idéia que pouco se faz para o aperfeiçoamento dos colaboradores da hotelaria. Encontrar pessoas com a cordialidade apurada e a atenção aguçada com o intuito de receber e prestar bem o seu serviço é difícil. Encontrar pessoas que sabem fazer uma boa comida ou operar eficientemente um computador ou mesmo limpar adequadamente um quarto de hotel já não é tanto assim, basta ter um bom treinamento sobre as habilidades desenvolvidas e ter um bom líder que possa estar supervisionando o trabalho e os orientando. Assim, o comportamento
hospitaleiro junto ao hóspede é o diferencial que o estabelecimento pode oferecer.
Diante desse cenário, a hospitalidade talvez seja um foco a ser trabalhado. Na verdade, deveria ser condição básica para a sobrevivência de qualquer empreendimento, principalmente de um empreendimento cujo produto não é tangível e que lida com pessoas. Wada, (Apud Dencker, 2004 p. 141) ao se referir sobre a hospitalidade pergunta se “não será apenas um fator essencial, quase óbvio na oferta ao consumidor de meios de hospedagem?”. Muitas vezes o óbvio, por ser óbvio, é deixado de lado. As pessoas se esquecem que os menores detalhes na hotelaria são os mais importantes. Aquilo que pareça ser evidente, não é menos importante aos olhos do hóspede e pode ser a condição para a sua permanência e fidelização ao hotel.
É nesse ponto que a pequena hotelaria deve se ater para se manter competitivo no mercado. Buscar novos nichos, novas hóspedes e fazer com que eles permaneçam no seu estabelecimento de hospedagem porque é bem atendido, se sente bem acolhido e tem bons quartos e higienização. Aliás, a hospitalidade está envolvida com o conjunto de todos os fatores que possam deixar o hóspede bem acomodado. Equipamentos e tecnologia modernos são importantes, mas juntos com a cordialidade no acolhimento completam os requisitos para a boa hospitalidade.
5. Setor de Recursos Humanos
Muitos são os nomes que se encontra para definir o setor que é o elo do colaborador com o seu empregador. Uns chamam de Recursos Humanos, outros de Talentos Humanos e pode se encontrar ainda como Gestão de Talentos. Não importa a nomenclatura que se dá, mas a compreensão da sua utilidade em uma companhia. Infelizmente, a posição do setor nunca foi valorizada da maneira que se devia, pois não o considerava diretamente influenciador no processo produtivo. As pessoas eram tratadas como máquinas e a sua performance estava relacionada ao salário e àquilo que a empresa poderia dar para resolver os problemas de sobrevivência de seus colaboradores. A função do setor de recursos humanos também é mudada com o modelo flexibilizado de
administração. Sempre confundido com o setor de pessoal, o R.H. se resumia nas questões burocráticas de relacionamento de uma empresa (folha de pagamento, contratação, encargos, etc…). Agora, passa a ser mais valorizado no tocante à gestão estratégica da empresa. Seu desafio está na promoção do encontro de interesses dos colaboradores, patrões e clientes e faz parte do processo de transformação e mudança da empresa. No quadro abaixo, Coutinho (2005) consegue colocar as principais exigências dos papéis do R.H..
Tabela 2
Principais Exigências Dos Papéis Do R.H.
Fonte: ( Coutinho at al, 2005)
Desafios novos que esperam o setor de Recursos Humanos de uma empresa. Desafios que se enquadram tanto para o setor da indústria como para o de serviços. A hotelaria passa pelo mesmo tipo de questões que devem ser observadas. É um setor que está constantemente lidando com pessoas tanto como seus clientes como com seus colaboradores. Tem peculiaridades que muitas empresas de serviços não possuem e precisa estar ainda mais atento ao fator qualidade porque lida com clientela exigente.
Levando para a realidade da hotelaria, o setor que cuida do aperfeiçoamento do colaborador deveria estar também preocupado com o treinamento dos mesmos, porém com o treinamento mais direcionado às questões da hospitalidade ao hospede. Direcionar a sua política de talentos humanos não somente àqueles relacionados ao processo produtivo, como técnicas de cozinha, recepção ou governança, mas ao relacionamento junto a sua clientela, tanto ao cliente
interno (colegas de trabalho, chefia, etc…) como aos hospedes. Também se preocupar mais com contratação de pessoas com perfil adequado para o trabalho em um hotel.
No sistema de trabalho, no que diz respeito ao perfil das pessoas que trabalham no sistema produtivo, alguns requisitos são importantes na contratação: o domínio das tecnologias, que é uma realidade em que as pessoas não têm como fugir e tem como condição para o sucesso do empreendimento; a pluri-competência, onde se exige competências diversas que possam qualificar o colaborador; relacionamento interpessoal, sendo o poder de comunicação com o
outro uma ferramenta de aproximação do cliente; trabalho em equipe; responsabilidade e espírito de iniciativa, e sentido de acolhimento. Acolhimento que seja integrador e dar credibilidade. Ai está a hospitalidade como um diferencial no trato com o turista.
Com o crescimento do turismo, houve sensível aumento de escolas preparatórias de profissionais do setor, principalmente ao trabalho ligado à hotelaria. Muitas faculdades e escolas profissionalizantes surgiram com conteúdos técnicos e não se preocuparam em pesquisar a real necessidade do mercado de trabalho e formando pessoas desabilitadas para cargos onde o pensamento criativo é requisitado, principalmente referindo-se aos cursos superiores. Assim
sendo, os profissionais que chegam ao mercado hoteleiro precisam passar por um processo de treinamento mais direcionado aos problemas do hotel em que irá atuar. A educação precisa ensinar sobre a ótica da realidade do aluno. O trabalho de saber em que ambiente ele está inserido e do que ele tem em volta de si, irá ajudá-lo no processo ensino-aprendizagem.
Levando esse pensamento para o mundo do turismo, é possível que a realidade seja mais complexa, pois temos duas situações diferentes acontecendo. Dois “mundos” que se diferem e que devem conviver harmoniosamente. O primeiro é o mundo dos profissionais que trabalham para o turismo, sua real situação de trabalho e como pertencente a um universo diferente daqueles que para quem ele trabalha: o turista. Pensando no Brasil, onde os problemas dos colaboradores da hotelaria ainda se encontram na satisfação das necessidades básicas, o treinamento de um ajudante de cozinha, garçom ou camareira deverá exigir as habilidades do instrutor para que possa confrontar com as necessidades dos turistas. O segundo é o mundo dos turistas que freqüentam o ambiente de trabalho desse público em questão. Um mundo onde existe diferença social e de interesses diversos aos dos colaboradores da hotelaria. O turista vem em busca de uma realização de um sonho e para isso ele paga e exige regalias agregadas. O colaborador de uma hotel, na sua maioria, vem em busca de uma necessidade de sobrevivência.
O setor dos talentos humanos, enquanto aquele que se responsabiliza pelo aperfeiçoamento dos seus colaboradores e sua relação com o hotel, deverá ter a sensibilidade suficiente para identificar as necessidades do seu cliente e ajustar com a necessidade do empreendimento hoteleiro. Averiguar quais as falhas que realmente precisam ser trabalhadas para serem amenizadas e refletir na produtividade do colaborador. Portanto, é uma responsabilidade mais estratégica que burocrática e que deveria ter maior atenção por parte da hotelaria familiar que domina o mercado brasileiro.
6. Considerações finais
Por mais que a entrada das redes hoteleiras no Brasil esteja acontecendo de forma acentuada nos últimos anos, é impossível negar que a hotelaria independente é a que mais está presente na maioria do território nacional. Centros como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba são os que mais se apresentam a hotelaria de rede, porém o restante do país não.
Essa “tranqüilidade” em que as outras localidades se encontram é passageira, pois aos poucos as potencialidades turísticas do interior do Brasil estão sendo descobertas e começam a serem vistos pelos investidores do setor. Contudo, a parcimônia gerencial como a hotelaria familiar nas capitais mais distantes estão agindo frente às mudanças de comportamentos do mercado, tem fechado muitos hotéis tradicionais no país.
Faz-se necessário uma mudança na forma de administração dos hoteleiros. Sair da falta de profissionalismo e buscar conhecer mais o hóspede que vem ao hotel. Buscar novas maneiras de fidelização do cliente para que se tornem verdadeiros propagadores do empreendimento.
A hospitalidade é uma das possibilidades para o começo de uma mudança de pensamento. No entanto, não a única solução. Ações conjuntas também são importantes para enfrentar o concorrente. Renovação física e estrutural, parcerias e novas formas de vendas também são atitudes que podem ajudar na permanência no mercado.
A reavaliação do setor de Recursos Humanos no hotel é fundamental nesse processo de mudança, afinal, é por meio dele que o hotel estará lidando com seus colaboradores. No texto foram apresentados os novos desafios desse setor. Percebeu-se que tem papel estratégico no processo produtivo e que pode estar profundamente ligado ao sucesso das mudanças.
Não se pode dizer que é o fim da hotelaria independente no Brasil. Certamente, é o momento de transformação de conceitos antigos e ultrapassados na forma de administração. Aquele que desejar se manter atuante na sua cidade, deverá repensar as suas ações e se preparar com profissionalismo e ética.
7.Referências bibliográficas
AMARAL, Ivan Bose do; CARVALHO, Caio Luiz de. Hotelaria independente no Brasil. Disponível em: http://www.brasilturisjornal.com.br/site.cfm?tp=WL&cg=ARTIG¬icia=4696 Acesso em: 19 set. 2005.
CAMARGO,Luiz Octavio de Lima. Os domínios da hospitalidade. In: BUENO, Marielys Siqueira; DENCKER, Ada de Freitas Maneti (orgs.). Hospitalidade: cenários e oportunidades. São Paulo: Thomson, 2003. p.7-27.
CASTELLI, Geraldo. Administração hoteleira. Caxias do Sul: EDUCS, 2000.
COUTINHO, Maria Teresa Correia,JOHANN, Sílvio Luiz, PEREIA,Cláudio de Souza, ROCHA-Pinto, Sandra Regina da. Dimensões Funcionais da Gestão de Pessoas – 4.ed.- Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005.
DIAS, Reinaldo; PIMENTA, Maria Alzira. A gestão em hotelaria e o cliente. Hotelnews, São Paulo, n. 325, mar./abr. 2005, p. 53.
GRINOVER,Lúcio. Hospitalidade e qualidade de vida: instrumentos para a ação. In: DENCKER, Ada de Freitas Maneti; BUENO, Marielys Siqueira (orgs.). Hospitalidade: cenários e oportunidades. São Paulo: Thomson, 2003. p.49-59.
HOTELARIA econômica se expande no Brasil. Hotelnews, São Paulo, n. 325, mar./abr. 2005, p. 33.
LASHLEY,Conrad.Para um entendimento teórico. In: LASHLEY, Conrad; MORRISON, Alison. Em busca da hospitalidade. São Paulo: Manole, 2004. p. 1-23.
ROBERTS, Chris – Competitive Advantages of service quality, in: KANDAMPULLY, Jay; MOK, Connie; SPARKS, Beverley (orgs) – Service quality managemnet in hospitality, tourism and leisure. Binghamton: The Haworth Hospitality Press, 2001.
WADA, Elizabeth Kyoko. Hospitalidade na gestão em meios de hospedagem: Uma realidade ou falácia?. In :DENCKER, Ada de Freitas Maneti (org.). Planejamento e gestão de hospitalidade e turismo: Formulação de uma proposta. São Paulo: Pioneira Thomson, 2004