MEUS POEMAS PREFERIDOS – Manuel Bandeira
Bom Humor Diante da Morte. (1886-1968)
Nasceu em Pernambuco, viveu e morreu no Rio.
Em 1917, estréia com “Cinza das Horas”, com características parnasianas, simbolistas e futuristas misturadas.
Viveu momentos dramáticos assistindo à morte de entes queridos e lutando pela própria vida.
Assim ele se autodefine:
Auto-Retrato
Provinciano que nunca soube
Escolher bem uma gravata;
Pernambucano a quem repugna
A faca do pernambucano;
Poeta ruim que na arte da prosa
Envelheceu na infância da arte,
E até mesmo escrevendo crônicas
Ficou cronista de província;
Arquiteto falhado, músico
Falhado (engoliu um dia
Um piano, mas o teclado
Ficou de fora); sem família,
Religião ou filosofia;
Mal tendo a inquietação de espírito
Que vem do sobrenatural,
E em matéria de profissão
Um tísico profissional.
Estilo
A poesia de Manuel Bandeira caracterizou-se pela variedade criadora, desde o soneto parnasiano, pela prática do verso livre, até por experiências com a poesia concretista. Por outro lado, conservou e adaptou ao espírito moderno os ritmos e formas mais regulares, como os versos em redondilhas maiores.
Em sua poesia, observa-se uma constante nota de ternura e paixão pela vida. Seu lirismo intimista registra o cotidiano com simplicidade, atribuindo-lhe um sentido de evento e espetáculo. Nela, também, estão presentes a infância, a terra natal, a cultura popular, a doença, a preocupação com a morte, a defesa da linguagem modernista, a sensualidade, o lirismo tradicional, o antilirismo, a reflexão existencial, a infância e o humor.
A MELANCOLIA
Verificamos, em Manuel Bandeira, traços indicadores de uma sensibilidade romântica, sobretudo de uma profunda tristeza, aliada ao desencanto e à melancolia. A confissão de seu estado de espírito, da presença do “eu” em poemas e da morte como motivo poético mais freqüente conferiu-lhe uma aura romântica:
AS LEMBRANÇAS
A infância, como retorno ao passado, opõe-se a este presente de angústia e dor vivenciado pelo poeta. O folclore, suas quadras e canções populares, a família sempre aparecerão ligados à infância:
Profundamente
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
– Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
ECOS PARNASIANOS E NÉVOAS SIMBOLISTAS
Em muitos poemas, Bandeira aproxima-se da estética parnasiana através da rigidez formal, da seleção de temas, da busca do universal e da apreensão objetiva da realidade.
Em outros textos aparecem o irracionalismo, as paisagens indefiníveis, nebulosas e as atmosferas crepusculares. O Simbolismo, que além dessas características privilegiou a musicalidade, despertará no poeta o gosto pelo subjetivismo, pela introspecção.
Paisagem Noturna
(…)
O plenilúnio vai romper. . . Já da penumbra
Lentamente reslumbra
A paisagem de grandes árvores dormentes.
E cambiantes sutis, tonalidades fugidias,
Tintas delinqüescentes
Mancham para o levante as nuvens langorosas.
A REVOLTA MODERNISTA
Assimilando as conquistas dos poetas do Modernismo, Manuel Bandeira, em muitos textos nos quais discute a prática poética, define esta nova postura estética.
Primeiramente, houve uma ruptura com o Parnasianismo, ou com a tradição lírica da época; depois, estes textos negariam as confecções e manifestariam o desejo de libertação:
Poética
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem-comportado
(…)
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
Muitas propostas da “fase heróica” do Modernismo (1922-1930) estariam incorporadas à sua poesia, entre elas: a fusão prosa/poesia, versos brancos (sem rimas), versos livres (sem métrica), nova utilização de sinais gráficos (linha pontilhada para indicar a respiração, por exemplo), o diálogo, o humor negro e a linguagem coloquial. Veja se você reconhece algumas destas características presentes no texto abaixo:
Pneumatórax
Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
– Diga trinta e três.
– Trinta e três… trinta e três … trinta e três…
– Respire.
– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e
o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
EXPERIÊNCIAS CONCRETISTAS
O Concretismo, poesia de vanguarda que se firmou na década de 60, também mereceu a atenção de Bandeira.
Palavras soltas, sonoridade, visualização.
A onda
a onda anda
aonde anda
a onda?
a onda ainda
ainda onda
ainda anda
aonde?
aonde?
a onda a onda
A EVASÃO E A UTOPIA
A opressão da realidade, a solidão e a doença conduziram-no à busca da evasão, à procura do lugar ideal, onde praticamente tudo seria possível:
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
– Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada