A obra de Elenor Kunz, denominada ‘Transformação Didático-Pedagógica do Esporte’ apresenta a CPCE, para anunciar e estimular mudanças reais e concretas na concepção de ensino da EF, bem como no conteúdo, no método e nas condições das possibilidades na prática pedagógica.
Para Kunz, o esporte é realizado predominantemente de forma cada vez mais normatizada e padronizada visando atender o rendimento cobrado pelas sociedades industriais. Para que o esporte possa ser praticado na escola, é preciso analisar quais os interesses, desejos e necessidades que formam a instituição.
O fenômeno social do esporte deve ter a capacidade de colocar o praticante na situação dos outros participantes no esporte; ser capaz de propiciar a visualização dos componentes sociais que influenciam todas as ações sócio-culturais no campo esportivo; além de poder desenvolver as competências da autonomia, interação social, bem como da competência objetiva.
A estrutura básica deve estar apoiada em pressupostos teóricos com base em critérios de uma ciência humana e social, formando alicerces do conhecimento para um agir racional-comunicativo; e na teoria instrumental, que deve fornecer os elementos específicos de uma pedagogia crítico-emancipatória nas suas seqüências e nos seus procedimentos regrados.
A didática comunicativa fundamenta a função do esclarecimento e da prevalência de racionalidade comunicativa, na qual se desenvolvem ações comunicativas, ou intenções simbolicamente mediadas.
A emancipação é entendida como o processo que media o uso da razão crítica e todo o seu agir social, cultural e esportivo, desenvolvidos pela educação. Ao induzir à auto-reflexão, a CPCE deverá possibilitar aos alunos um estado de maior liberdade e conhecimento de seus verdadeiros interesses, ou esclarecimento e emancipação.
Em vez de ensinar os esportes na EF pelo simples desenvolvimento de habilidades e técnicas do esporte, deverão ser incluídos conteúdos de caráter teórico-prático que tornam o fenômeno esportivo transparente, permitindo aos alunos a melhor organização da realidade do esporte, dos movimentos e dos jogos de acordo com as suas possibilidades e necessidades; a interação solidária e social em princípios de co e autodeterminação; e se expressar como ser corporal no diálogo com o mundo. Para o autor, o homem conhece o mundo através do se – movimentar, o que estabelece a relação homem-mundo no mundo vivido e enquanto sistema.
O conteúdo para o ensino dos esportes na EF não pode ser apenas prático, deve ser também problematizado. Além das análises críticas do esporte, deve ser oferecida a oportunidade de tematizar o esporte de diferentes formas e perspectivas, através de programas ou cursos específicos.
As encenações do esporte são constituídas de regras a serem seguidas e nas quais o desempenho dos papéis depende de um texto em que a abordagem e as ações são rigidamente estabelecidas. Poderiam também auxiliar na melhor compreensão do fenômeno esportivo, na avaliação e no entendimento das mudanças históricas do homem, na possibilidade de desenvolvimento de diferentes encenações do esporte e a interpretação de diferentes papéis (espectador, atleta, amadores, praticantes, torcidas, fãs, sucesso, vitórias, derrotas, superação e ideais esportivos).
Pela encenação do esporte podem ser destacadas manifestações pedagógicas do ensino, como o trabalho, a interação e a linguagem. Para tanto, há de se partir dos elementos determinantes do sentido/significado da encenação do esporte para os diferentes contextos, considerando: o sujeito, ator ou atores, da encenação esportiva de acordo com suas vivências e experiências de corpo e de movimento; o mundo do movimento e dos esportes que precisa ser criticamente compreendido pela encenação; as diferentes modalidades de encenações do esporte no sentido histórico e sócio-cultural, o sentido/significado como determinação normativa que indica as pretensões de validade para cada encenação esportiva.
Uma concepção de ensino que se orienta nos pressupostos desta perspectiva estabelecida e que se explica na prática pela didática comunicativa, privilegia para esta interação e para a linguagem: o saber-fazer, o saber-pensar e o saber-sentir.
A subjetividade tem relevância pedagógica fundamental, pois é social, assumida e vivida por indivíduos em suas existências particulares, é ‘nossa’ forma de conhecer o mundo no qual se incluem objetos, a natureza, os outros e nós mesmos.
É o processo por meio do qual o homem se desenvolve no contexto social concreto, numa relação tensa entre um ‘ser social’ e um ‘ser individual’, e neste desenvolvimento os indivíduos se encontram e confrontam com mecanismos hegemônicos que desafiam e pressionam o indivíduo para uma forma de desenvolvimento estereotipado.
A relação de se – movimentar com a subjetividade humana é fundamentalmente uma relação de sensibilidade, pois a prática de exercícios repetitivos retira significados individuais nas realizações humanas: na EF, o sentido da aula deve ser o de um ensino de libertação das falsas ilusões, através da concepção crítica e pelo questionamento crítico dos alunos.
O professor deverá promover o ‘agir comunicativo’ entre seus alunos, para expressar entendimentos do mundo social, subjetivo e objetivo; a interação nas tomadas de decisão; formulação de interesses e problematização do esporte.
Em situação concreta de ensino, o esporte é uma das objetivações culturais expressas pelo movimento humano com hegemonia universal, com valor educacional no sentido crítico-emancipatório, desde que exercido responsavelmente pelo professor, e a transformação didático-pedagógica se dá pela identificação do significado central do se – movimentar de cada modalidade esportiva.
Enquanto permanece o significado dos movimentos esportivos, muda o sentido individual e coletivo, no caso de um grupo de aula. O ponto de referência central na transformação didática dos esportes é o aluno e o ensino escolar. Assim, devem ser consideradas as condições e situações do se – movimentar do aluno e do contexto escolar em que ele está inserido.
Uma aula segue um plano de desenvolvimento que está inserido em um programa de ensino para cursos (de dança, ginástica e atividades lúdicas) que são elaborados pelo professor e apresentados, discutidos e reformulados com os alunos. Cada aula tem uma essência que apresenta um conteúdo a ser desenvolvido, um objetivo a ser atingido, uma metodologia que orienta a ação e um prazo ou tempo total em meses a ser cumprido.
Além disso, é interessante trabalhar com ‘arranjos materiais’ para facilitar e compensar deficiências na execução de movimentos mais complexos ou que necessitem de maior força e velocidade, fazendo com os alunos vivenciem, elabore arranjos, signifiquem e dêem sentido às atividades de acordo com a sua subjetividade.
Os profissionais que atuam cotidianamente na EF podem garantir uma mudança efetiva ou propor um ‘programa mínimo’ de conteúdos e métodos para cada série escolar, que por sua vez, abra espaço para a luta pela melhoria das condições locais e materiais da sua escola, bem como melhoria da ‘bagunça interna’ da EF, enquanto disciplina/atividade.
Redimensionar os programas, objetivos e metodologias em função da carga de exigências sociais que incide sobre as disciplinas escolares, inclusive a EF, trará a formação crítico-emancipatório da escola, e não de uma disciplina.