Autor: Luiz Adolfo Vargas de Oliveira
PICORNAVÍRUS
CARACTERÍSTICAS E PROPRIEDADES
Os picornavírus representam uma imensa família de vírus com relação ao número de membros, mas é uma das menores em relação ao tamanho dos vírions. Esta família engloba 2 grupos principais: os enterovírus e os rinovírus.
Muitos picornavírus provocam doenças em seres humanos, como a paralisia (incompleta e reversível), hepatite, lesões cutâneas, doenças respiratória, conjuntivite, etc.
Os enterovírus de origem humana incluem os seguintes tipos: poliovírus (3 tipos – poliomielite), vírus Coxsackie A (23 tipos – meningite), vírus Coxsackie B (6 tipos – meningite), vírus echo (34 tipos – diarréia). Enterovírus também são encontrados em muitos animais, inclusive em gado bovino, suínos e camundongos, causando, por exemplo, febre aftosa. Os rinovírus humanos incluem mais de cem tipos antigênicos, incluindo o resfriado comum. Incluem ainda como hospedeiros os equinos e os bovinos.
Os enterovírus são habitantes temporários do trato alimentar humano e podem ser isolados da garganta ou das porções baixas do intestino. Por outro lado, os rinovírus são isolados sobretudo em material da garganta e do nariz.
O vírion dos enterovírus e dos rinovírus consiste em um capsídeo com 60 subunidades, cada qual com quatro proteínas (VP1 a VP4) dispostas em simetria icosaédrica em torno de um genoma constituído por um filamento único de RNA de sentido positivo. As três maiores proteínas virais (VP1-VP3) estão envolvidas com neutralização de infecção viral. Os enterovírus são estáveis em pH ácido durante uma a três horas, porém são termolábeis. Os rinovírus são termoresistentes e acido-lábeis. No quadro um encontramos propriedades importantes dos picornavírus.
Quadro 1
Vírion: Icosaédrico (lhe confere estabilidade), cerca de 27 nm de diâmetro, contém 60 subunidades;
Composição: 30% RNA e 70% proteína;
Genoma: RNA de filamento único, linear, de sentido positivo (funciona como RNA-m), infectante;
Proteínas: Proteínas superficiais VP1 e VP3 são os principais locais de ligação de anticorpo. A VP4 está associada com RNA viral;
Envoltório: Nenhum;
Características notáveis: A família é constituída por muitos membros que infectam seres humanos e animais, provocando várias doenças.
FEBRE AFTOSA (AFTOVÍRUS DO GADO)
CONCEITUAÇÃO E HISTÓRICO
A febre aftosa é uma doença de animais, aguda e contagiosa, também chamada aftosa. É conhecida desde 1514, quando foi descrita pela primeira vez com um surto ocorrido na Itália. No Brasil foi constatada pela primeira vez em 1896 em MG. Dentre as várias espécies sensíveis, as mais atingidas são a bovina e a suína, mas também ovinos e caprinos, além de vários animais selvagens. Nos equídeos ocorre uma doença com sintomatologia idêntica: trata-se da aftosa dos cavalos. É endêmica no México e Canadá e rara nos EUA.
SINAIS CLÍNICOS
No homem, se caracteriza por febre, salivação e vesiculação das muscosas da orofaringe e da pele nas regiões palmares e plantares, e dos dedos das mãos e dos pés. Nos animais, caracteriza-se por estado febril inicial, seguido por erupção vesicular, que se localiza nas membranas mucosas e na pele, particularmente na cavidade bucal, tetas e espaço interdigital.
Na camada epitelial da língua, o vírus provoca aparecimento de um ou várias vesículas (aftas). Das vesículas, o vírus passa para o sangue, provocando viremia, que se caracteriza por acentuada elevação de temperatura. O sangue distribui o vírus por todo o organismo, localizando-se preferencialmente no epitélio das mucosas e da pele, onde aparecem as vesículas secundárias. A mucosa da cavidade bucal, a língua, as tetas e o tecido interdigital são os pontos de eleição do vírus. O período de incubação (estado oculto) varia de 2 a 7 dias. Nas figuras A, B, C, D e E observamos os sintomas.
O AGENTE CAUSADOR E FATORES QUE O INATIVAM
A aftosa é causada por um enterovírus, como foi demonstrado em 1897, um dos menores que se conhece, medindo 23nm, sendo ácido-lábil. Existem pelo menos 7 tipos: O, A, C, SAT1, SAT2, SAT3 e Ásia1, sendo os 3 primeiros clássicos com ocorrência no Brasil, e os outros exóticos. Ainda existem mais de 50 subtipos (ocorrência rara).
Os principais fatores para conservação ou destruição do vírus aftoso são: dessecação, temperatura e pH. Este vírus, a 37°C resiste de 4 a 5 dias. A 55°C é destruido de 15 a 40 minutos e a 100°C, morre instantaneamente. Em pH ácido, é destruído rapidamente. O pH ideal está entre 7 e 7,5.
TRANSMIÇÃO
Esta doença pode ser transmitida ao homem por contato ou ingestão. Os animais adquirem a doença, via de regra, por contato com a saliva dos doentes, que contamina a água e as forragens. De grande importância também são os animais portadores, que continuam eliminando o vírus ativo por um período que varia de acordo com a espécie. A aftosa pode ser transmitida ainda pelos ordenhadores e pessoas que cuidam de animais doentes e sadios.
CONSEQUÊNCIAS DA AFTOSA
As sequelas deixadas são de gravidade variável e contribuem para diminuir consideravelmente o valor econômico dos animais. O vírus pode lesar o músculo cardíaco resultando em redução da capacidade de trabalho. As lesões de úbere provocam redução ou parada da produção láctea, além de se tornarem maus produtores de carne. Como consequência das lesões do casco pode surgir um processo supurativo que atinge as articulações mais próximas, fazendo com que o animal pise com mais dificuldade.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico clínico baseia-se no aparecimento de uma infecção febril, que atinge vários animais ao mesmo tempo, disseminando-se rapidamente no rebanho, acompanhado de lesões vesiculares na cavidade bucal, teta e espaços interdigitais. O diagnóstico laboratorial é feito a partir de coleta do epitélio lingual ou dos pés.
PROFILAXIA
Os métodos de controle da doença são ditados pela sua elevada contagiosidade e pela resistência do vírus à inativação. No Brasil o método mais eficiente é a vacinação sistêmica das espécies a cada 4 meses e alguns cuidados devem ser tomados, como limpeza regular e ventilação dos estábulos, alimentos de fácil mastigação, limpeza bucal com soluções adstringentes e anti-sépticos (água com limão ou vinagre), as ulcerações do casco devem ser tratadas e desinfetadas. Nos EUA, todos os animais expostos são sacrificados e suas carcaças destruídas. Uma quarentena rigorosa é estabelecida, e a área não é considerada segura até que todos os animais suscetíveis não apresentem sintomas durante 30 dias. Outro método é a quarentena do rebanho e a vacinação de todos os animais não afetados. Outras nações proibem a importação de material potencialmente infectante, como carne fresca, e a doença foi eliminada em tais regiões. Mesmo assim, aves migratórias podem desempenhar o papel de carreadores do vírus. Deve-se proteger o rebanho cerca de dois a três meses antes do aparecimento presumível do surto epizoótico (surto que ataca mesmos animais), procedendo-se à inoculação da vacina em animais acima de três meses. A imunidade se estabelece cerca de 14 dias após a vacinação, período em que eles devem ser poupados de qualquer esforço. A duração da imunidade é de 4 a 6 meses.
IMUNIDADE E VACINAS
A imunidade após a infecção é satisfatória, porém passageira. A doença pode ocorrer no mesmo rebanho mais de uma vez por ano, em virtude da infecção por tipos ou subtipos diferentes.
As vacinas tratadas por formol foram preparadas por vírus cultivados em cultura no tecido da língua dos bovinos. Elas não produzem imunidade duradoura sendo necessárias inoculações frequentes de reforço. A vacina consagrada com maior experiência no campo é a de Schmidt-Waldmann, preparada com vírus proveniente da língua de bovinos, inativado pelo formol.
BIBLIOGRAFIA
Microbiologia Médica Jawetz, Ernest – Guanabara Koogan, 18ª ediçao;
Biologia Celular e Molecular Junqueira, L.C. e Carneiro, J. – Guanabara Koogan, 5ª edição
Bacteriologia e Imunologia Bier, Otto – Editora Melhoramentos, 14ª edição
Clínica de Doenças Tropicais e Infecciosas Meira, Domingos Alves – Editora Interlivros, 1ª edição