Poesia para um mundo melhor
“Por que poesia no tempo de indigência?” Essa não é, com certeza, uma pergunta fácil de ser respondida, todavia não é impossível. Contudo é necessário que, primeiro, façamos algumas considerações sobre o que entendemos ser poesia.
A poesia é uma forma diferente de ver, analisar e relatar o mundo com os seus “ires e vires”. Ela é aquela força superior e divinamente humana que faz com que nós encontremos – ainda que perdidos e completamente fragmentados numa sociedade desumana e insensível – beleza, inspiração e até motivação nas coisas e cenas mais vulgares, pervertidas e corruptas da nossa dura realidade para continuarmos vivendo. Ela está para a alma assim como a água está para a vida. Ela nos faz chorar e rir, e se emocionar e refletir, e ver que a vida é mais do que um talão de cheques ou um carro ou uma carreira. Ela é um nada ou um tudo subjetivo e abstrato que se transforma num tudo concreto e vivo, pois nos revela uma vida, ou fragmentos de vidas, de homens comuns que, assim como nós , marcaram sua existência sob a luz do sol. A poesia, então, é uma verdade ou uma forma de verdade subjetiva e fonte reveladora de mundos que está presente, ainda que de forma fracionada, em todas as coisas do mundo e que se fragmenta em verdades várias de acordo com o olhar e – eu me atreveria a dizer – o desejo de cada um de nós, simples observadores humanos.
Visto que, a poesia não tem cor; não tem sexo; não tem classe social; não tem religião; não tem nacionalidade e, muito menos, ideologia política. Ela é, também, uma forma de inclusão social e de troca de experiências humanas. Por meio dela, nós podemos e conseguimos aproximar o branco e o negro; o homem e a mulher; o mais rico dos homens ao mais pobre; o Cristão e o ateu; o judeu e o alemão ou o francês e o inglês e o representante mais radical da direita ao mais radical da esquerda. Tudo isso, porque a poesia está na natureza humana e visa, somente, o nosso bem e a nossa felicidade. Ela é aquela “coisa” que revela que eu, um rapaz de olhos e cabelos castanhos e pele morena ou preta, estando aqui numa favela do Rio de Janeiro, carente de toda e qualquer proteção do Estado, tomado de um estado de plenitude ou em um completo estado de nihilismo, não sou em nada inferior ou superior, porém apenas diferente, daquele rapaz de olhos azuis, cabelos claros e pele branca que, neste mesmo momento, está lá em Londres ou Nova Iorque ou Paris ou Berlim ou Madri ou Roma ou Lisboa sentado a uma cadeira e manuseando um teclado de um computador de última geração “playing cards”.
Poesia é também uma forma singela e, às vezes, bruta e vulgar, que temos de, utilizando-se de experiências alheias e distantes, conhecermos a nós mesmos. Ela, a partir do momento em que revela recortes e momentos de vidas humanas, faz com que nós nos deparemos com situações normais do nosso cotidiano e com ações da mais diversa natureza que nós, na correria da vida comum, não paramos para analisar ou para fazer qualquer tipo de consideração por mais simples que seja. Por essa razão, a poesia é também uma forma agradável e prazerosa de buscarmos o auto conhecimento e o auto controle. Pois, trabalhando com ela, vemos que pessoas tão memoráveis, famosas e tão distantes não só em relação ao tempo, mas também ao espaço, sofreram e sofrem, e estavam e estão sujeitas às mesmas leis que nós, simples leitores, e nos mostra como que cada uma dessas pessoas lidou e venceu ou foi vencida pelas dores, medos e aflições tão constantes na existência humana. E o mais interessante é que, muitas vezes, são situações e relatos ou ações não reais, mas que são contadas com tanta firmeza, beleza, singeleza e veracidade que, ainda que fingidas, se tornam “verdadeiras” para cada um de nós. Porque o homem não é só razão, ele é emoção, sonho, fantasia. Afinal de contas, somos humanos e, não sei por qual razão, gostamos de ser “enganados”.
Apesar das condições dos dias atuais, a poesia, portanto, deve e precisa ser ensinada ainda com mais intensidade. Ela não é somente uma forma que temos para dar vazão aos nossos sonhos, aflições, medos e desejos mais obscuros, mas é também uma força e um meio que nos faz sonhar e acreditar no homem e na própria vida. Ela é um sentimento que temos aqui dentro que faz – ainda que por alguns minutos ou por algumas mal traçadas linhas – com que nos sintamos gente e nos leva a perceber que estamos vivos. A poesia torna a labuta diária menos árdua e nos dá a certeza de que somos muito mais que um simples registro no Ministério do Trabalho.
Vando Victal