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terça-feira, novembro 19, 2024

REVOLUÇÃO FRANCESA

REVOLUÇÃO FRANCESA

DO ESTADO ABSOLUTISTA À QUEDA DA BASTILHA

Antes de mais nada, é preciso deixar claro que o significado da Revolução Francesa para a história universal já está sendo revisto e repensado pelos historiadores em âmbito internacional. Até o momento, o predomínio cultural que a França exerceu sobre diversos países da Europa continental e de outras partes do mundo, entre os quais o Brasil, deu destaque ao papel da Revolução Francesa na construção de uma ordem social mais justa e democrática. Ao mesmo tempo, valorizou o papel dos filósofos iluministas franceses como teóricos da democracia e mentores intelectuais do movimento revolucionário.

Atualmente, os historiadores já começam a destacar a importância das revoluções políticas ocorridas no século 17 na Inglaterra e da Revolução Americana na construção dessa nova ordem democrática, ao mesmo tempo que apontam o caráter autoritário e dogmático do pensamento dos filósofos franceses, bem como a excessiva violência que marcou o processo revolucionário na França.

Do mesmo modo, já se está demonstrando que os avanços efetivamente democráticos e duradouros que se estabeleceram na França ocorreram após a Era napoleônica, que marca simultaneamente o apogeu da Revolução e o seu fim.

Feitas essas ressalvas, podem-se narrar os fatos desse episódio histórico cuja importância é inegável, mas que ainda carece de uma interpretação mais justa. O grande historiador holandês Johan Huizinga já dizia que “a história é a interpretação do significado que o passado tem para nós”.

O ANTIGO REGIME
De meados para fins do século 18, a França era um país basicamente agrário, com 20 milhões de camponeses. Cinco milhões de franceses habitavam as cidades, das quais a principal é Paris, com 500 mil habitantes. A população nacional crescera e continuava crescendo, em virtude das novas técnicas de cultivo e da melhoria da alimentação. A industrialização começava, gerando redução de preços e aumento do consumo.

No entanto, no país ainda vigora uma sociedade estamental originada na Idade Média. Socialmente, a França se divide em três estados: 1) Primeiro estado – os bispos e o alto clero; 2) Segundo estado – a nobreza que tem o monopólio dos altos cargos militares (nobreza da espada) e as altas funções jurídicas (nobreza da toga); 3) Terceiro estado: muito variado, abrange desde a alta burguesia (banqueiros, empresários, grandes comerciantes) até os camponeses (muitos dos quais em condição servil) e os pobres da cidade.

Podemos considerar o primeiro e o segundo estados como a aristocracia, grupo que usufrui de diversos privilégios, como a arrecadação de impostos dos que vivem e trabalham em suas propriedades, a isenção de impostos em relação ao Estado, as pensões que este pode lhes pagar, o monopólio dos cargos eclesiásticos ou estatais, etc. Ao terceiro estado – dos mais ricos aos mais pobres – cabe arcar com os custos desses privilégios, seja com dinheiro, produtos agrícolas ou trabalho.

O ESTADO: ABSOLUTISTA E FALIDO

No âmbito político, a França era um reino onde vigorava o absolutismo: o rei monopoliza a administração, concede os privilégios, esbanja dinheiro num luxo espetacular e controla os tribunais, enviando seus opositores ou desafetos para a Bastilha – a odiada prisão que se tornou um símbolo do regime. Mas o rei e o Estado francês não conseguiam gerir a economia.

A arrecadação de impostos, por exemplo, está na mão dos particulares (nobres) que exploram o terceiro estado, mas não repassam o que devem ao rei. Para enfraquecer a Inglaterra, no plano internacional, a França apoiou a Guerra de Independência Americana – o que lhe custou 2 bilhões de libras. A dívida externa da França era de 5 bilhões de libras, o dobro do dinheiro que estava em circulação no país.

Em 1786, um acordo comercial permite que a indústria inglesa sufoque a iniciante indústria francesa. Dois anos depois, uma grande seca diminui drasticamente a produção de alimentos: enquanto os camponeses passam fome, a miséria da plebe nas cidades se torna absoluta. O descontentamento é geral e a situação está se tornando explosiva.

OS ESTADOS GERAIS

Para resolver o problema, o rei Luís 16 convocou a Assembleia dos Notáveis (nobreza e clero) propondo que esses abdiquem de seus privilégios tributários passando a pagar impostos. Diante da recusa dos Notáveis, o rei convoca, em abril de 1789, a Assembleia dos Estados Gerais, que, como o nome deixa ver, inclui representantes do terceiro estado. Durante a eleição dos deputados, eclodem revoltas por todo o país, devido à miséria e à fome.

A reunião dos Estados Gerais tem início no mês de maio. Os estados, porém, votam em conjunto, de modo que a nobreza e o clero conseguem sempre impor seus interesses por 2 a 1. O terceiro estado, que conta com a maioria dos deputados (578) se rebela (junho) e, com a adesão de 90 deputados da nobreza esclarecida e 200 do baixo clero, formam a Assembleia Nacional, que logo se torna Constituinte. O rei acata essa disposição, procurando ganhar tempo e reunir tropas para se impor.

A 13 de julho, entretanto, em Paris uma organização militar popular que no dia seguinte – o célebre 14 de julho de 1789 – toma a Bastilha. A explosão revolucionária se espalha pela França inteira. Camponeses saqueiam os bens da nobreza e invadem cartórios, queimando escrituras e documentos de propriedade de terras. A 4 de agosto, a Assembleia Constituinte, para conter o movimento, abole de imediato os velhos direitos feudais dos aristocratas sobre os camponeses.

DIREITA E ESQUERDA: CONTENÇÃO E RADICALIZAÇÃO

Em 26 de agosto, a Assembleia aprova a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”, um documento marcado pelas ideias liberais e iluministas, que defende o direito à liberdade, a igualdade de todos perante a lei, a inviolabilidade da propriedade e o direito do povo resistir à opressão. Foi nessa sessão que os aristocratas se encontravam sentados à direita do presidente da Assembleia, enquanto os democratas do terceiro estado se encontravam à esquerda – o que gerou a denominação política que sobrevive até a atualidade.

O processo político é mais lento nos momentos seguintes e inclui uma infinidade de fatos e posições que não vêm ao caso. Sua conclusão dá-se em 1791 com a aprovação da Constituição. De acordo com ela, o poder executivo caberia ao rei e o legislativo, à Assembleia. O feudalismo foi abolido e suprimiram-se os privilégios e as antigas ordens sociais, com a proclamação da igualdade civil. O trono continuava hereditário. O mandato dos deputados duraria dois anos e só seria eleitor quem tivesse um mínimo de riqueza. Finalmente, manteve-se a escravidão nas colônias francesas.

O REI TENTA FUGIR

Com seus poderes limitados, Luís 16 tentou fugir para o exterior – para onde já haviam ido muitos nobres. Com o apoio destes e das potências estrangeiras, pretendia iniciar uma contrarrevolução. Na fuga, porém, foi reconhecido e preso, permanecendo à espera de julgamento. A prisão do rei e o sucesso da revolução estimulou simpatizantes das ideias antiabsolutistas e democráticas em muitos países europeus. Entretanto, gerou apreensão nos governos aristocráticos desses países que começaram a planejar a invasão da França.

A pressão externa resultou, internamente, numa radicalização revolucionária. A unidade inicial do terceiro estado contra os aristocratas desapareceu, cedendo lugar a uma complexa composição político-partidária, na qual se destacariam dois partidos: 1) os girondinos, formados pela alta burguesia que defende as conquistas da revolução, mas não quer mais avanços nas concessões aos trabalhadores e às classes pobres, os chamados sans-culottes; e 2) os jacobinos, pequena e média burguesia que, sob a liderança de Robespierre, quer mais avanços, contando com o apoio das massas populares.

PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

Luís 16 apoiava os girondinos, em quem confia para esfriar os ânimos dos revolucionários. O rei conseguiu vetar a convocação do exército para enfrentar os inimigos da revolução, que estão cada vez mais ativos no exterior. Desse modo, exércitos formados por nobres exilados e tropas austro-prussianas invadiram a França. Liderados por Danton e Marat a massa massacra os aristocratas que estão nas prisões, ao mesmo tempo em que o exército francês vence os invasores, em 20 de setembro de 1792. Nessa mesma noite, a República é proclamada.

CONVENÇÃO

Uma nova Assembleia Constituinte foi convocada, com o nome de Convenção. Era composta majoritariamente por jacobinos, liderados por Robespierre e Saint-Just. Em 21 de janeiro de 1793, Luís 16 foi julgado e condenado à morte na guilhotina. A nova Constituição cria uma Assembleia de 750 deputados, eleitos por sufrágio universal masculino, órgão que elegeria uma mesa dirigente com funções executivas.

No resto da Europa, as forças absolutistas se congregam de modo a evitar a expansão revolucionária e preparando novos ataques à França. A Convenção se defendeu criando o Comitê de Salvação Pública, que controlava o exército, o Comitê de Segurança Nacional, para garantir a segurança interna, e o Tribunal Revolucionário, para julgar todos aqueles que forem considerados contra-revolucionários.

O TERROR E O DIRETÓRIO

Os girondinos se tornam suspeitos. Muitos são presos e guilhotinados. Tem início o período conhecido como Terror, que se estende de junho de 1793 a julho de 1794. O Tribunal Revolucionário prende mais de 300 mil pessoas e condena 17 mil à morte. Entre elas, incluem-se até radicais e jacobinos.

A própria população francesa passou a ansiar o abrandamento da repressão. Robespierre e Saint-Just, os comandantes do terror, são presos e guilhotinados. Os girondinos aproveitaram o momento e tomaram o controle da situação. Em 1795, o chamado Ano 3 da República, promulga-se uma nova Constituição, que estabelece um novo poder executivo, composto de cinco diretores eleitos, daí seu nome, o Diretório.

Contudo, as conspirações e revoltas não deixaram de continuar ocorrendo. Para restabelecer a ordem, considera-se a necessidade de um governo forte. De um acordo entre dois diretores, Sieyés e Ducos, resulta um golpe de Estado que estabelece um novo poder executivo: o Consulado. Nele dividem o poder os dois ex-diretores mencionados e um terceiro personagem que marca o fim da Revolução Francesa propriamente dita e o início de grandes transformações internacionais: o general Napoleão Bonaparte.

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