INTRODUÇÃO
Desde o aparecimento do ser humano que não existe indivíduo sem sexualidade. Este termo, muitas vezes remete-nos a idéia limitada à genitalidade, de forma restrita ao âmbito das relações sexuais. Porém, apesar desse campo ser integrante de sua construção social, a sexualidade transcede esse aspecto.
Portanto, sexualidade tem um sentido amplo, definindo-se em um conjunto de formas de como as pessoas expressam a busca do prazer, englobando, além dos aspectos sexuais, os desejos e sentimentos de afeto provenientes das relações interpessoais. Vale salientar que persiste ainda pouco diálogo a esse respeito, ocasionando a existência de muitas dúvidas, culpas, medos, pressões e repressões.
SEXUALIDADE E SAÚDE MENTAL
Diante desse contexto, o que se falar então da sexualidade em saúde mental?
Segundo Birman (1980), a sexualidade dos doentes mentais tem sido vista apenas como uma função biológica desde o surgimento da psiquiatria clássica, não se enfocando os seus reais desejos e sentimentos advindos de um relacionamento sexual tido como normal. Dessa forma, a abordagem integral a esses usuários fica comprometida. Eles se vêem excluídos da rede de relações sociais e dos afetos que se fazem imprescindíveis nessas relações e, portanto, numa qualidade de vida insatisfatória.
Geralmente a sexualidade do doente mental não é considerada no espaço institucional. Ela é visualizada como anômala, sendo contida pela equipe de saúde. Isso se faz através da proibição, consistindo numa repressão sobre os seus corpos, sem qualquer preocupação explicativa.
Diante disso, vê-se a necessidade da concretização de idéias trazidas pela reforma psiquiátrica. Nesse novo modelo dá-se ênfase à sociabilidade, valorizando-se as trocas interpessoais como medida terapêutica, sendo o indivíduo estimulado a estabelecer relações com pessoas, independente do sexo. Isso propicia o aparecimento da sexualidade que já é encarada com mais flexibilidade. Além disso, trabalhar os preconceitos, medos e respeito à diferença torna-se fundamental.
A sociedade ignora a existência da sexualidade dos deficientes mentais. Assim, os indivíduos internados sentem-se discriminados e rejeitados. Segundo um deles: “O preconceito existe (…) O que a pessoa lá fora sente, nós sentimos também. Tanto faz a gente estar boa ou ruim, a sexualidade existe em todos os sentidos (…) é de todo ser humano.” (Sol).
Sabe-se que a patologia mental pode interferir diretamente na forma de relacionamento social e afetivo, onde as funções sexuais podem, dependendo do tipo de caso, apresentar-se exacerbadas ou diminuídas. Estas alterações ocorrem tanto por motivos do próprio transtorno quanto por efeitos colaterais de medicamentos utilizados no tratamento do mesmo. Substâncias presentes em hipnóticos e anti-depressivos, por exemplo, podem diminuir a sensibilidade, portanto, retardar o organismo, influindo diretamente na minimização do impulso sexual. Da mesma forma, outros medicamentos específicos podem deixar os usuários mais propensos a ter seu nível de excitação aumentado.
Observa-se, entretanto, que os profissionais de saúde ainda não se encontram preparados para lidar com esses fatores. Uma das causas desse quadro é a falta de capacitação dos mesmos, da divulgação e incentivo a pesquisas e informações no âmbito da sexualidade em saúde mental. É notória a necessidade de se trabalhar esse tema nas instituições para que estes profissionais sintam-se preparados para lidar com as situações diversas, diminuindo seus receios e estando preparados para agir, intervindo dentro do possível na busca de soluções. Desse modo, facilita-se o cumprimento das metas de promoção, proteção e recuperação da saúde da população, propostas pelo SUS.
Outro fator que interfere na realização de ações é a dificuldade ou falta de oportunidade dos profissionais em trabalharem primeiramente a sua própria sexualidade. A maioria das pessoas possui uma idéia padronizada da sexualidade e espera que os demais correspondam e se ajustem a esta. O grande erro dos profissionais de saúde é usarem como referencial suas próprias expectativas para soluções desta natureza, ignorando os contextos variados em que a sexualidade dos internados se estabelece.
A partir do momento em que é possível a exteriorização de dúvidas e superação de preconceitos, o trabalhador de saúde pode sentir-se mais apto a tomar decisões quanto ao pensar e ao agir nos mais variados casos. Através da prévia resolução de seus próprios conflitos interiores este encontrará fundamentos para intervir na solução de problemas.
O número de pacientes portadores do HIV e outras DST’s na Saúde Mental vem crescendo consideravelmente, gerando a necessidade de se criar estratégias de prevenção. Para isso, é imprescindível a discussão prévia sobre sexualidade. Como trabalhar então a vulnerabilidade ao HIV/AIDS se a questão da sexualidade ainda é um tabu entre os profissionais de saúde mental e pacientes psiquiátricos?
Estudos mostram que muitos doentes mentais crônicos têm uma vida sexual ativa, sendo que poucos se protegem em suas relações. A falta de conhecimento nesse aspecto pode levar os profissionais a negligenciarem a avaliação de comportamentos de risco, a orientação de uma prática sexual protegida, bem como na proteção contra abusos sexuais. Existem ainda fatores que potencializam esses riscos, como a impulsividade e diversos distúrbios de personalidade dos deficientes mentais.
CONCLUSÃO
É necessário, portanto, adotar novos métodos que visem melhor atender os usuários no âmbito da sexualidade, relacionado à promoção e prevenção das DST’s, através de recursos como: grupos operativos, grupos de familiares, oficinas terapêuticas e atendimento ambulatorial. Nestas atividades, discutir-se-iam temas referentes aos cuidados com a saúde e sexualidade, onde os usuários expressariam suas dúvidas e sentimentos, bem como aprender a usar corretamente o preservativo. Os temas, em sua maioria, seriam trazidos pelos próprios participantes, sendo estes usuários de ambos os sexos, possibilitando uma rica troca de experiência, além da discussão das diferenças de gênero.
Diante do exposto, urge uma reflexão e conscientização da sociedade como um todo, principalmente da equipe de saúde para aprender a aceitar o deficiente mental como um ser humano, possuidor de necessidades, desejos e direitos à busca do prazer, seja sentimental ou físico.