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segunda-feira, dezembro 23, 2024

União Estável entre Homossexuais

1.Introdução

A expressão “casamento gay” remete à idéia de alegres rapazes entrando de véu e grinalda na Candelária ao som de Mendhelson. Nada mais falso. A questão que a sociedade civil discute em todo o mundo é a extensão às uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo dos direitos legais já atribuídos às uniões heterossexuais. Nada a ver, portanto, com o casamento como sacramento ou qualquer outra coisa que envolva religião. O que está em jogo são pensões, direitos de herança e sucessão, que não têm nada de metafísico.Sendo, no entanto, esses o assunto delimitado no artigo, a meação do patrimônio.

Não temos como principal objetivo julgar conceitos, embora julguemos, mas fazer com que algumas pessoas enxerguem algo que já existe, porem encontra-se parado num mundinho atrasado chamado preconceito.

Independentemente de reconhecer ou não a união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, faz-se necessário a discussão sobre possíveis soluções jurídicas a serem propostas para fins patrimoniais. Embora, o Estado não reconheça legalmente a união homoafetiva, é notório que, diversas vezes, esse tipo de relacionamento acaba por gerar um patrimônio comum construídos pelos companheiros.

A Constituição Federal, consagra, em seu artigo 1.º, inciso III, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Esse princípio de direito natural, positivado em nosso ordenamento jurídico, ressalta a necessidade do respeito ao ser humano, independente da sua posição social ou dos atributos que possam a ele ser imputados pela sociedade. Sempre é válido citar o comentário do prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho sobre o tema:

“Dignidade da pessoa humana. Está aqui o reconhecimento de que, para o direito constitucional brasileiro, a pessoa humana tem uma dignidade própria e constitui um valor em si mesmo, que não pode ser sacrificado a qualquer interesse coletivo.” (Ferreira Filho, 2000. p. 19)

O professor Alexandre de Moraes dispõe de maneira semelhante:

“O princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever de tratamento igualitário dos próprios semelhantes (grifos nossos)”.

Este dever configura-se pela exigência de o indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição federal exige que lhe respeitem a própria. A concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do Direito Romano: honestere vivere (viver honestamente), alterum non laedere (não prejudicar ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é devido) (grifos nossos)”. (Moraes, 2002. p. 129)

Ora, se o ser humano constitui por si próprio um valor, que deve ser respeitado e preservado, é fundamental que o qualquer tipo de relacionamento de seres humanos, desde que lícito, deve ser reconhecido pelo ente estatal, uma vez que os valores humanos fazem parte de seu próprio substrato emocional e intelectual. Essencial relembrar o grande Ortega Y Gasset em sua máxima: “Eu sou eu e minhas circunstâncias; se não as salvo, não me salvo.”

A falta de dispositivo legal sobre a matéria tem tornado cada vez mais importante a atuação do operador do direito a fim de solucionar, com eqüidade, tais questionamentos. Dessa forma, é vital o entendimento do “fenômeno social jurídico” em epígrafe. A fria exegese legal não deve ser confundida pelo jurista como aplicação do Direito. Este deve ser, primeiramente, entendido como fato social; produto da atuação dos atores sociais em seu meio. Assim, é imprescindível a inteligência de Pontes de Miranda sobre o tema:

“Diante das convicções da ciência, que tanto nos mostram e comprovam explicação extrínseca dos fatos (isto é, dos fatos sociais por fatos sociais, objetivamente), o que se não pode pretender é reduzir o direito a simples produto do Estado. O direito é produto dos círculos sociais, é fórmula da coexistência dentro deles. Qualquer círculo, e não só os políticos, no sentido estrito, tem o direito que lhe corresponde.” (Miranda, 1955 p.170)

Nesse contexto, faz-se mister a releitura do entendimento do art. 4.º da Lei de Introdução ao Código Civil, a qual transcrevemos in verbis:

“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”

Ora, claro nos parece que, dentro do corte epistemológico na sociedade brasileira contemporânea, o fenômeno da união estável homossexual está claramente evidenciado e aceito. Cabe então, aos magistrados, advogados e doutrinadores, o entendimento desse fenômeno como parte do meio social para a utilização dos princípios e métodos adequados à defesa dos interesses dessas pessoas.

2.Evolução histórica da união estável

Tornou-se comum no Brasil a figura da sociedade de fato caracterizada pela convivência entre pessoas com o ânimo de formar família. A evolução conceitual (e legislativa) sobre o tema foi bastante lenta. Nunca foi crime o “concubinato”, mas a nossa legislação costumava desprezá-lo. O ordenamento jurídico pátrio não reconhecia (hipocritamente) a família havida fora do casamento

A Constituição Federal de 1988 veio a sepultar de uma vez essa celeuma, reconhecendo como entidade familiar, passível de proteção estatal a união estável entre homem e mulher. (art. 226 art. § 3.º) A matéria foi regulamentada pela Lei n.º 8971, de 29 de dezembro de 1994 e pela Lei n.º 9278, de 10 de maio de 1996.

3.Caso concreto

Como corolário desse princípio, a nossa Carta Magna também outorga, em seu art. 5.º, inciso I, a isonomia legal entre homens e mulheres. Isso significa que a lei não pode instituir tratamento desigual entre pessoas que se encontrem em mesma situação fática e/ou jurídica. Partindo desse entendimento, indispensável reconhecer a coragem e a lucidez da oitava câmara cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao reconhecer a união homossexual a partir da inteligência do dispositivo constitucional.

“EMENTA: Homossexuais. União Estável. Possibilidade jurídica do pedido. É possível o processamento e o reconhecimento de união estável entre homossexuais, ante princípios fundamentais insculpidos na Constituição Federal que vedam qualquer discriminação, inclusive quanto ao sexo, sendo descabida discriminação quanto à união homossexual.(grifos nossos) E é justamente agora, quando uma onda renovadora se estende pelo mundo, com reflexos acentuados em nosso país, destruindo preceitos arcaicos, modificando conceitos e impondo a serenidade científica da modernidade no trato das relações humanas, que as posições devem ser marcadas e amadurecidas, para que os avanços não sofram retrocesso e para que as individualidades e coletividades, possam andar seguras na tão almejada busca da felicidade, direito fundamental de todos. (grifos nossos) Sentença desconstituída para que seja instruído o feito. Apelação provida.. (9 FL S) (Apelação Cível Nº 598362655, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des José Ataídes Siqueira Trindade., Julgado em 01/03/00)”

Apesar desse tipo de decisão ser exceção na jurisprudência do país, muitos magistrados têm interpretado a união homoafetiva como uma sociedade de fato, uma vez que há um esforço dos companheiros destinados a um fim comum. Dessa forma, têm-se multiplicado as sentenças fundamentadas na Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, transcrita a seguir:

“Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”

Nesse sentido, os tribunais têm entendido válida a partilha de bens após a dissolução da união homossexual. Nesse sentido já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em acórdão que transcrevemos abaixo:

“Ementa: Apelação Cível. Ação de Reconhecimento de Dissolução de Sociedade de Fato cumulada com partilha. Demanda julgada procedente. Recurso improvido”.

Aplicando-se analogicamente a Lei 9278/96 (grifos nossos), a recorrente e sua companheira têm direito assegurado de partilhar os bens adquiridos durante a convivência, ainda que dissolvida a união estável. O Judiciário não deve distanciar-se de questões pulsantes, revestidas de preconceitos só porque desprovidas de norma legal.(grifos nossos). A relação homossexual deve ter a mesma atenção dispensada às outras ações. Comprovado o esforço comum para a ampliação ao patrimônio das conviventes, os bens devem ser partilhados. Recurso Improvido” (Tribunal de Justiça da Bahia. Apelação Cível n.º 16313-9/99. Terceira Câmara Cível. Relator: Des. Mário Albiani. Julgado em 04/04/2001).

Acreditamos muito lúcida essa decisão através da utilização da analogia da Lei 9278/96 e da Súmula 380 do STF. De fato, é indiscutível a existência da sociedade de fato. Entretanto, a maioria dos tribunais ainda não reconhece à união estável homoafetiva no tocante à concessão de alimentos, sendo omissa no reconhecimento de outros aspectos de caráter não-patrimonial. Muitas prestações que são fornecidas pelo(s) companheiro(s) não são passíveis de apreciação pecuniária. São prestações de caráter doméstico, afetivo ou emocional que não se incorporam ao patrimônio, mas são INDISPENSÁVEIS à convivência harmoniosa e pacífica de pessoas que possuem vida comum e à própria constituição do patrimônio.

Tendo como base esse entendimento, criticamos o acórdão proferido pela Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que negou a prestação de alimentos a uma mulher por sua ex-companheira com base, unicamente, pela natureza homossexual do relacionamento.

“Ementa: Agravo de Instrumento. O relacionamento homossexual não está amparado pela Lei 8971 de 21 de dezembro de 1994, e Lei 9278, de 10 de maio de 1996, o que impede a concessão de alimentos para uma das partes, pois o envolvimento amoroso de duas mulheres não se constitui em união estável, e semelhante convivência traduz uma sociedade de fato. Voto vencido. (21 fls) (Agravo de Instrumento nº 70000535542, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Antônio Carlos Stangler Pereira, Julgado em 13/04/00)”.

Data maxima venia, discordamos em absoluto com esse entendimento. Ora, se o mesmo Tribunal reconheceu competência das Varas de Família o julgamento de questões relativas às uniões homoafetivas, (entendendo, por conseguinte, essa instituição como familiar) e mais; se o Tribunal entendeu válida a aplicação analógica da Lei 9278/96 (que regula o regime de bens da união estável heterossexual), torna-se incoerente a não-aplicação analógica do dispositivo referido para a concessão de alimentos a ex-companheiros do mesmo sexo.

4. Discurssão da visão contemporânea sobre o assunto

Quando se fala em posições contrárias a união civil entre pessoas do mesmo sexo, obrigatoriamente nos questionamos a respeito da posição da Igreja a respeito do assunto.

Obviamente os católicos e protestantes ortodoxos são unânimes em condenar este tipo de relação. A CNBB trabalha declaradamente contra o projeto da Deputada, argumentando que a aprovação do projeto colocará em risco a família, que é considerado o mais importante instituto na organização da sociedade, colocando em risco até mesmo a própria civilização

Outro segmento social que é declaradamente contra o projeto Suplicy, são as Forças Armadas. Os militares também são radicalmente contra a presença de homossexuais nos quadros da corporação.

Recentemente, um capitão do exército foi preso no Rio de Janeiro quando mantinha relações homossexuais dentro de seu carro. Como conseqüência, o capitão foi expulso da corporação, além de responder a inquérito policial.

Nos Estados Unidos, o atual presidente Bill Clinton, no início do seu mandato comprou uma briga com a ala conservadora do congresso norte americano e com a alta cúpula das Forças Armadas ao prometer acabar com a discriminação dos gays nas Forças Armadas.

No Brasil, o ex-ministro da Marinha, almirante Maximiliano da Fonseca, defendeu apaixonadamente, sua opinião: “Sou contra o casamento entre gays. Os Veados já estão com muito poder. Não é possível. Prefiro machões – como Sérgio Motta e Antônio Carlos Magalhães – do que certos veados”.

Todavia, existem religiosos heterodoxos que tratam a questão de modo diferente. É o caso do reverendo presbiteriano Roberto Gonzalez, que em junho do ano passado abençoou 14 homossexuais, durante a Conferência Mundial da International Gays and Lesbians Association, no Rio.

Recentemente o pastor Nehemias Marien, da Igreja Presbiteriana Bethesda de Copacabana, passou a celebrar casamentos homossexuais em seu templo e, eventualmente, em residências. Logo passou a ser tachado de “Pastor do Demônio”. Segundo o Pastor Nehemias a sua seita possui uma mentalidade liberal, pluralista e ecumênica, que aceita na Comunhão Eucarística credos divergentes do sistema teológico como budismo, judaísmo e ateus. Ele diz que o objetivo da sua Igreja é o seguinte: “O objetivo da minha Igreja é destruir com marretadas toda a forma de preconceito, discriminação e intolerância, que pontificam na hipócrita moral religiosa.”

Entretanto, por incrível que pareça, a idéia é combatida também por homossexuais. O francês Gilles Lascar, proprietário da boate Le Boy, um clube noturno do Rio de Janeiro, notoriamente freqüentado por homossexuais, acha que o Projeto Suplicy deveria se preocupar com os direitos humanos e dos preconceitos da sociedade em relação aos gays.

Ele afirma o seguinte: “Casar pra quê? Afinal, pesquisas sobre o casamento entre heteros revelam que a maioria pede divórcio após um ano de relacionamento. Por que entre os gays seria diferente?”

A própria Bíblia entende como pecaminoso e impuro a atração física por pessoas do mesmo sexo.

“Com homem não te deitarás como se fosse mulher: é abominação.” (Levítico 18:22)

” Pelo que Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza.

E, semelhantemente, também os varões, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, varão com varão, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa eu convinha ao seu erro.” (Romanos 1:26-27)

5.Opinião pessoal

Quem de nós nunca viu um homossexual? A resposta é unânime para todos nós. É claro que todos nós já vimos um homossexual. Agora, se nós perguntarmos: Quem de nós nunca viu um homossexual sofrer discriminação? A resposta também será unânime para todos nós. É claro que todo homossexual é alvo de discriminação. E o pior é que a discriminação começa dentro da sua própria família, começa pelos consangüíneos. Raros são os casos de homossexuais que têm o apoio da família quando revelam a sua opção sexual. O que normalmente ocorre é a decepção dos pais pela opção do filho ou da filha. A discriminação dos parentes, amigos e da sociedade em geral.

Na escola, os meninos afeminados são excluídos do grupo dos meninos. O mesmo acontecendo com as meninas masculinizadas, pois os seus colegas não querem ser vistos em sua companhia, pois temem ser ridicularizados pelos demais companheiros de escola.

No trabalho, muitos são obrigados a esconder a sua verdadeira opção sexual para não perder o emprego. A mesma coisa na carreira militar, onde os homossexuais não são admitidos. Caso sejam descobertos são expulsos da corporação.

Normalmente os homossexuais só deixam de ser discriminados quando conseguem mostrar a sua competência profissional (e a maioria deles é). Talvez por causa das adversidades que a vida lhes impõe e da necessidade de superar toda espécie de humilhação.

Quando um homossexual aparece em posição de destaque na sociedade, percebendo um bom salário ou sendo proprietário de um negócio altamente rentável, a coisa começa a mudar um pouco de figura.

Imaginem se homossexuais declarados como Clodovil, os falecidos Cazuza e Renato Russo, não tivessem alcançado o sucesso e a fama. Será que eles seriam tratados pela sociedade da mesma forma? Provavelmente não. E muito provavelmente, eles devem ter sofrido muita discriminação quando escolheram assumir a sua homossexualidade.

Todavia, muitos homossexuais não têm a mesma sorte. São discriminados por seus familiares e obrigados a sair de casa para enfrentar a vida e lutar pelo seu espaço. Na maioria das vezes, encontram apoio em outras pessoas com o mesmo tipo de problema, passam a viver juntas, trabalham juntas, constituem um patrimônio juntas, etc.

De repente, por uma fatalidade um deles (ou delas) vem a falecer. O motivo não importa, pode ser de AIDS, acidente, infarte fulminante, assassinato, o que for. Imediatamente os familiares que o expulsaram de casa e que o discriminaram, são os primeiros a pleitear os bens por ele deixados, em detrimento do parceiro ou parceira que com ele conviveu, trabalhou, apoiou nos momentos de dificuldade e que às vezes cuidou dele até a hora de sua morte, como no caso de Jorginho Guinle.

Então vem a pergunta: Será que era esta a vontade do falecido? Será que é justo que aqueles que nunca lhe deram atenção fiquem com todo o fruto de seu trabalho? Será que o seu companheiro ou companheira deve ficar sem nada?

Para muitas pessoas foi só mais um veado que morreu. Era só uma bicha, um pederasta, um boiola, um gayzinho, ou qualquer outra palavra usada para menosprezar um ser humano. Isto só por causa da sua opção sexual.

Esta é apenas uma das várias hipóteses em que pode ocorrer tal fato, pois Os homossexuais são vítimas de discriminação de inúmeras outras formas. Com o advento da “Revolução Sexual”, ocorrida no fim da década de 60 e início da década de 70, os homossexuais se organizaram e começaram uma verdadeira guerra para conquistar seu espaço.

Como já foi dito, vários países, principalmente os escandinavos, adotaram leis que permitem a União Civil ou proíbem a discriminação aos homossexuais.

No Brasil, o Projeto da Deputada Marta Suplicy, é a primeira tentativa de regulamentação da convivência entre pessoas do mesmo sexo.

O projeto prevê o direito à herança, a sucessão, benefício previdenciário, seguro-saúde conjunto, declaração conjunta de imposto de renda e direito à nacionalidade no caso de estrangeiros.

De uma forma geral o Projeto é bom, pois irá amparar legalmente a convivência entre os homossexuais, de uma forma geral.

Todavia, ao analisarmos o Projeto verificamos que ele poderá ser adotado por heterossexuais, pois a homossexualidade não é um requisito essencial para a validade do contrato. E porquê dois heterossexuais teriam interesse em firmar um contrato de união civil? Talvez para fraudar o imposto de renda, o seguro-saúde ou a própria previdência social. E o pior de tudo, há também a possibilidade de marginais tentarem assegurar a nacionalidade brasileira para um estrangeiro que desejasse fugir das garras da lei de seu país. Como no caso de Ronald Biggs, o ladrão do Trem Pagador que não foi extraditado para a Inglaterra por ter se casado com uma brasileira e ter tido um filho brasileiro. Ou seja, estaríamos correndo o risco de transformar outro bandido em herói, porque ele conseguiu enganar a polícia.

Outro fato verificado no texto do projeto de lei, diz respeito aos impedimentos. Pelo Projeto, só não seriam impedidos de celebrar o contrato de união civil as pessoas solteiras, viúvas ou divorciadas. Desta forma, nada impede que o contrato seja celebrado entre parentes consangüíneos, entre o tutor e o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados, ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas. Estes são alguns impedimentos para o casamento, previstos no Código Civil, com o intuito de dificultar os atos fraudulentos que visam tirar proveito de pessoas que possuem um patrimônio capaz de alimentar as mentes maquiavélicas de plantão.

Além disso, o Projeto de Lei não estabelece o foro competente para julgar os processos oriundos de uma União Civil entre pessoas do mesmo sexo. Seria competência da Vara de Contratos ou da Vara de Família? Lembramos que esta dúvida também ocorreu quando começaram a surgir os primeiros processos baseados na Lei dos Conviventes, sendo que somente depois de uma longa batalha doutrinária e jurisprudencial em vários Tribunais brasileiros o problema foi resolvido, estabelecendo-se que a Vara de Família teria competência para decidir sobre tais processos.

Como se pode observar o projeto tem falhas, isto é, deixa brechas que podem ser muito bem aproveitadas pelos canalhas e cafajestes que passam o tempo pensando em burlar a Lei, causando prejuízos irreparáveis ao Estado e a sociedade. E neste caso, com uma enorme agravante, que fatalmente iria denegrir ainda mais a imagem dos homossexuais, que fatalmente levariam a culpa, caso algum fato dessa natureza vier a ocorrer. Pior ainda, se for amplamente divulgado pela imprensa, pois seriam bombardeados pelos segmentos sociais que foram contrários ao Projeto, caso ele venha a ser aprovado e transformado em Lei.

Embora a causa seja muito justa, o Projeto de Lei de UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO precisa observar estes detalhes, pois apesar de regular uma causa justa, “um legítimo direito de cidadania”. Tais fatos precisam ser observados e analisados com muito cuidado para que a justiça não fique abarrotada de processos de difícil solução e para que os homossexuais não levem a culpa pelos resultados indesejáveis de uma Lei que só teve o interesse de beneficiá-los, mas que também pode ser aproveitada por pessoas inescrupulosas que farão de tudo para atingir seus interesses, sem se incomodar em prejudicar aqueles que apenas lutam pelo direito de ter uma reputação mais adequada a um ser humano.

Em face do exposto, pedimos que enquanto não aprovado o projeto de lei de união civil entre pessoas do mesmo sexo, que se utilize os meios legais disponíveis, objetivando unicamente a justiça, para isso vendo a relação homoafetiva como uma sociedade de fato, uma vez que há um esforço dos companheiros destinados a um fim comum e, além disso, analisando o preceito constitucional da dignidade da pessoa humana, consagrado no art. 1.º, III que por não ser respeitado tem colocado muitas pessoas, que mantêm com outrem do mesmo sexo uma relação, não só de afetividade, mas também de vida comum, numa situação de total desamparo, configurando assim, uma veemente injustiça.

6. Conclusão

A partir da análise dos argumentos no presente trabalho, é possível concluir que a existe a necessidade de se reavaliar determinados conceitos em Direito de Família. Mais ainda; é preciso destituir-nos do moralismo que circunda o meio jurídico e encarar o fato da existência da união entre pessoas do mesmo sexo e da necessidade desse tipo de união receber amparo legislativo, e não ficar entregue apenas ao entendimento judicial.

É preciso que o operador do Direito esteja cada vez mais atento às transformações que ocorrem em nossa sociedade, a fim de que venha ele, efetivamente, ser um instrumento de transformação social e não apenas um técnico em legislação. É este o único modo de reduzirmos os abismos que separam o cidadão do Estado a fim de alcançarmos uma sociedade mais igualitária e justa para todos.

7. Referencias Bibliográficas

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